Na arte, (quase) nada se cria. No cinema, menos ainda: algumas histórias já foram contadas tantas vezes que fica difícil resistir à tentação de checar o relógio no meio das sessões. “O Último Ato” traz esse incômodo déja-vu, apresentando-nos a um ator no fim de carreira que, diante da decadência, reage transformando a vida real numa tragédia dramática.
Misturar a realidade à ficção é um recurso adorado pelos roteiristas, pois permite brincar à vontade com os fatos, distorcendo-os sempre que necessário para renovar o interesse do público. O problema é que, por trás dessas brincadeiras, é preciso ter uma única história sólida e coerente.
Não é o caso. Simon Axler (Al Pacino) é um ator de teatro veterano que conversa consigo mesmo enquanto ensaia, diante do espelho, para sua próxima apresentação. Sob os holofotes, ele esquece as falas, nota o desprezo do público e, literalmente, salta para fora do palco, ferindo-se e aposentando-se da atuação por tempo indeterminado.
O filme começa quente, com a câmera muito próxima do rosto de Pacino, que expressa a convicção que se espera de um profissional com sua experiência. Obsessivamente, ele se pergunta se sua atuação é convincente. “Você acreditou nisso?”, questiona-se, depois indaga à enfermeira com um gemido. “Pareceu real? Posso diminuir um pouco a dor, parece exagerado. Aaah... Melhor assim?”
O ator perfeccionista do início, entretanto, não é o mesmo que emerge após a crise. Simon de fato traz o drama para sua rotina, mas, ao escalar uma coleção de malucos como seus coadjuvantes, torna-se o mais comum e menos interessante de seus personagens.
Muitas das coisas que acontecem nesse tempo são imaginadas ou exageradas – e o espectador sabe disso, o que reduz bastante o fator-surpresa. A principal delas é a chegada de Pegeen (Greta Gerwig), uma afilhada que o ator não via há anos. Sem motivo aparente para visitá-lo, ela simplesmente bate à sua porta e se instala ali, permanentemente.
Pegeen revela ser lésbica, mas também diz que é apaixonada pelo padrinho desde a infância. Os dois engatam numa relação estável, mas cheia de fetiches, incluindo um ménage à trois, uma ex-namorada transexual e telefonemas ameaçadores de outras mulheres na calada da noite.
A personagem oscila entre uma mulher sedutora e uma garota mimada, deixado claro que pelo menos parte de sua personalidade pode estar na mente do ator. O que incomoda, porém, é que nenhuma das duas versões de Pegeen teria razões concretas para estar ali, e nenhuma das duas provoca uma transformação substancial no protagonista, fragilizando o esquema de ilusões que o filme tenta construir.
Perdido em retalhos, com sub-tramas que não se fecham e um desfecho confuso, “O Último Ato” não consegue se destacar entre outros filmes com histórias semelhantes e falha em balancear realidade e ficção, apostando em clichês que já não têm o mesmo impacto. O filme é a adaptação do romance de Philip Roth por Barry Levinson (“Bom Dia Vietnã”) e tem estreia prevista para janeiro nos cinemas.
Assista se você:
- Gostou do livro de Philip Roth
- Quer ver uma boa atuação de Al Pacino
- Gosta de filmes sobre teatro
Não assista se você:
- Está cansado de filmes sobre atores decadentes
- Não quer ver um filme com discussões barulhentas e banais
- Espera ver um filme diferente
Por Juliana Varella
Atualizado em 2 Dez 2014.