Na última década, a profusão de boas obras transformadas em franquias tediosas (“Shrek”, “A Era do Gelo”, “Piratas do Caribe”) fez com que qualquer nova sequência chegasse aos olhos do público com desconfiança. Não é o caso de “Como Treinar o Seu Dragão 2”: o filme que chega aos cinemas no próximo dia 19 é tão inteligente, gracioso e ousado quanto o primeiro. Ou até mais.
Todos os ingredientes de um filme de aventura (infantil e com dragões) estão lá: fogo, corridas aéreas, boas piadas, muita fofura, um pouco de romance, nobreza e maldade, para agitar as coisas. Mas isso é apenas o começo.
Dean DuBlois volta para dirigir o segundo filme pela Dreamworks. O estúdio vem provando que cresceu, e agora briga de igual para igual com Disney e Pixar pelas melhores animações do ano. Também voltam Soluço, Banguela e todo o povo de Berk que conhecemos em 2010.
Soluço agora está mais velho, e recebe de seu pai a notícia de que deve se tornar o líder da aldeia. Ele não quer: não se sente apto e acha que sua crença na paz e no diálogo não combinam com o papel de líder.
Soluço abomina a guerra e esse é um dos pontos mais interessantes da franquia: ao contrário de um herói guerreiro, temos um “treinador”, um herói democrático que conquista seus seguidores pela amizade, não pela força. Não é por acaso que seu dragão, Banguela, age como um cão: ele simboliza essa amizade incondicional.
Do outro lado, estará Draco Sangue Bravo, um vilão com quem “não se pode dialogar” e que quer construir um exército de dragões. Este é um personagem vilânico de fato, que tem um passado que justifica apenas superficialmente suas ações (servem de desculpa para sua tirania natural, mas não chegam a humanizá-lo).
Aqui, o poder pela tirania se contrapõe ao poder pelo diálogo, o que, para Soluço, é o mesmo que dizer que a guerra se contrapõe à paz, já que ele não aprova a violência. A questão, então, é saber se o garoto conseguirá afastar esse inimigo sem usar a força (ou usando, digamos, o mínimo necessário).
Ao contrário de outros contos que envolvem batalhas, os dois lados (homens e dragões) não se unem apenas por causa desse inimigo comum: a união é o objetivo, não o meio. O vilão, neste caso, é apenas um catalisador para que Soluço se perceba líder e possa promover essa união dentro e fora de sua ilha.
A mensagem pacifista do filme não se resume ao discurso de Soluço: diversos personagens se mostram tolerantes, colocando a amizade ou o amor acima de eventuais discordâncias. Isso acontece com o chefe da aldeia, por exemplo, quando, ao invés de castigar o filho, vai atrás dele apoiá-lo e protegê-lo.
Além de Berk e do esconderijo de Draco, um terceiro universo se apresenta para nós: um refúgio congelado de dragões mantido por uma figura misteriosa (ou nem tanto, já que ela foi revelada num dos trailers). Ao conhecê-la, Soluço ganhará mais convicção de seu caminho e aprenderá novos valores que o tornarão líder.
Outra personagem feminina também desponta com força neste filme: Astrid, a melhor amiga/namorada de Soluço no primeiro filme. Ela lidera os outros “cavaleiros” numa jornada paralela, que acaba concentrando boa parte da ação.
É interessante perceber que, em nenhum momento, ela ou a “personagem misteriosa” precisam ser resgatadas, revertendo ainda outro clichê do gênero. Pelo contrário, elas tomam decisões independentes que têm grandes consequências para a história. Astrid, é claro, protagoniza um romance com o herói – mas esse é delicado e sem excessos, nem passa por provações. O foco é outro.
Nas cenas em que Astrid e Soluço conversam no início do filme, é possível notar com detalhes a perfeição dos gráficos, que imitam movimentos e texturas humanos sem deixarem de parecer, enfim, “desenhos”. Visualmente, “Como Treinar o Seu Dragão 2” é o filme mais impactante do estúdio e um dos mais bem feitos dos últimos tempos em animação. Como um presente, os créditos finais vêm acompanhados por ilustrações feitas à mão, como num livro infantil.
Belo, divertido e com um roteiro inteligente, “Como Treinar Seu Dragão 2” eleva-se como um dos melhores filmes do ano, para crianças e adultos, e entra para a lista de animações maduras (onde reinam, também, “Up – Altas Aventuras”, “Os Incríveis” e o primeiro “Como Treinar o Seu Dragão”).
O fato de ser uma sequência se justifica em parte pelo fato de a franquia ser inspirada numa série de 12 livros, mas, se considerarmos que as adaptações têm bastante liberdade, este é um sinal de respeito pelo público. Um respeito de quem sabe que seus fãs merecem qualidade.
Assista se você:
- Gostou do primeiro filme
- Gosta de animações mais adultas
- Quer rever o dragão mais fofo do cinema
Não assista se você:
- Não gosta de filmes de aventura
- Não gostou do primeiro filme
Por Juliana Varella
Atualizado em 3 Fev 2015.