Jogos de poder e repressões sexuais em ambientes minimalistas não são novidade para Roman Polanski. Conhecido por obras como “Repulsa ao Sexo”, “O Bebê de Rosemary” e, mais recentemente, “Deus da Carnificina”, o cineasta se lança agora ao metalinguístico “A Pele de Vênus”, adaptação da peça homônima de David Ives que, por sua vez, é uma interpretação do romance de Leopold Von Sacher-Masoch – cujo nome, como se pode notar, inspirou o termo “masoquismo”.
O longa segue à risca a visão de Ives, mas traz nas entrelinhas a essência do diretor polaco. No palco (diante das câmeras), estão sua esposa e colaboradora fiel, Emmanuelle Seigner, e Mathieu Amauric, de aparência e postura não muito distantes das suas próprias. Amauric interpreta um diretor de teatro que procura uma atriz para viver sua “Vanda”, a aristocrática dominatrix do século XVIII que também se revela a reencarnação de Vênus/Afrodite. Já Seigner é a candidata improvável que surge no meio da tempestade e, enquanto tenta convencê-lo de que é a pessoa certa para o papel, inverte a situação e se coloca no comando.
O filme inteiro se passa dentro de um velho teatro e é embalado pelo diálogo entre os dois. Usando apenas palavras, diretor e atriz se revezam no poder e tentam moldar um ao outro, de forma cada vez mais literal. O interessante é que, no meio da leitura do texto, Vanda (a atriz leva o mesmo nome da personagem) quebra a ilusão para fazer comentários como “isso é tão sexista que me faz querer gritar”.
A linha entre atores e personagens (ambos personagens, na realidade) vai se desfazendo aos poucos, até que não sabemos mais o que é roteiro, improviso ou opinião pessoal. A tensão cresce, acompanhada pela chuva e por figurinos que Vanda não para de materializar de dentro de sua enorme mala, preparando o terreno para um final triunfante.
Esse final, porém, talvez seja o ponto fraco da adaptação. Fora do teatro, certas alegorias parecem não funcionar tão bem e o que poderia ser expressivo no palco se torna mau gosto na tela. Sob uma trilha cômica, a sequência que encerra o duelo parece fora de lugar.
Além disso, Polanski se contradiz ao repudiar, de início, uma frase do livro de Masoch (“Deus o puniu e o entregou às mãos de uma mulher”), para depois resgatá-la como uma tese comprovada. Essa ideia maniqueísta rompe com toda a estrutura do filme, que trabalha com a provocação de que o submisso estaria manipulando o dominador tanto quanto o contrário.
“A Pele de Vênus” estreia no dia 24 de setembro nos cinemas e é mais um capítulo polêmico na filmografia do cineasta, que promete dividir opiniões. Vale a pena conferir.
Por Juliana Varella
Atualizado em 22 Set 2015.