Esteja avisado: “Filho de Saul” é um filme pesado. Ao final da sessão, você não estará se sentindo bem e não terá certeza se gostou ou não do que viu. Mas é essa mesmo a ideia: o drama húngaro (em co-produção com outros quatro países) propõe uma visão nova sobre o Holocausto, focando nos efeitos psicológicos do horror sobre um tipo específico de prisioneiro: aquele que, em troca de alguns meses a mais de vida, é obrigado a trabalhar, na chacina contra o próprio povo.
Saul Ausländer (Géza Röhrig) é o protagonista, um judeu preso num campo de concentração nazista que, no momento em que o conhecemos, está orientando um grupo de novos detentos para o vestiário. Lá, ouvimos alguém dizer a eles que se lembrem dos cabides onde guardaram suas roupas, mas sabemos que eles nunca mais as vestirão. Saul também sabe e, após o banho de gás, entra na câmara para retirar os corpos e fazer a limpeza do local. Ele e seus colegas têm consciência de que sua vez chegará em breve.
Dois elementos incomodam muito em “Filho de Saul”, mas são essenciais para a narrativa. O primeiro é a câmera, que acompanha o protagonista o tempo todo num close exagerado, sobre seu ombro, como se fôssemos condenados a uma liberdade tão limitada quanto a sua. O segundo é o próprio Saul: com uma expressão vazia, ele anda de um lado ao outro como uma máquina, ou um zumbi, seguindo ordens sem erguer os olhos nem pronunciar uma palavra.
É um mero relance de expressão que passa por seu rosto quando ele vê o menino. Um sobrevivente, em meio a todos os mortos – não por muito tempo, já que o médico chega logo para asfixiá-lo e pedir sua autópsia. Será esse o filho de Saul? Algumas passagens do filme colocarão o parentesco em dúvida, mas o fato é que o protagonista encontra, no menino, um motivo para viver.
O garoto está morto, não há dúvida, mas Saul decide dar a ele um enterro decente e, para isso, precisa sequestrar o corpo, encontrar um rabino e cavar uma cova longe dos olhos dos guardas. O interessante é que sua jornada pessoal acontece paralelamente a um plano de rebelião dos detentos, que exigem sua participação. Escolherá ele os vivos ou os mortos? A escolha é mais complexa do que isso: de um lado, está a luta por sobrevivência, mesmo que desumana; do outro, o ritual pela transcendência da vida, mesmo que curta.
“Filho de Saul” levou o Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes e foi vencedor do Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro, o que faz dele o favorito para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. O longa, dirigido pelo estreante László Nemes, estreia no Brasil no dia 4 de fevereiro.
Por Juliana Varella
Atualizado em 25 Jan 2016.