A cada comédia nacional que chega aos cinemas (salvo justas exceções), uma pergunta martela na cabeça de, pelo menos, uma pequena parte pensante dos espectadores: alguém ainda ri dos mesmos estereótipos de vinte anos atrás? Enquanto, no resto do mundo, roteiristas (bons e ruins) tentam encontrar graça no modo de vida contemporâneo – rindo da internet, das famílias misturadas ou da tragédia diária das cidades grandes -, no Brasil a graça ainda está no estrangeiro, no negro, no judeu e na bunda.
A nova produção da Globo Filmes, “Made In China”, parte justamente de um grupo de estrangeiros para fazer sua piada: em especial a máfia chinesa que domina feirinhas e mercados suspiciosamente baratos nas capitais. No caso, a história se passa na Saara do Rio de Janeiro.
Regina Casé usa toda sua simpatia para interpretar Francis, uma vendedora cheia de lábia numa loja de brinquedos e cacarecos, cujo dono é um árabe (Otávio Augusto) e o locador é um judeu (Gilberto Marmorosch). Lá, também trabalha a “popozuda” Andressa (Juliana Alves), o mulherengo Carlos Eduardo (Xande de Pilares) e o preguiçoso filho do dono Peri (Luis Lobianco).
As vendas começam a cair quando os chineses (Liú Wang, Tony Lee e Yili Wang) abrem um loja do outro lado da rua, com os mesmos produtos pela metade do preço. Preocupada, Francis decide investigar a legalidade dos negócios na casa vizinha.
A premissa poderia ser ousada, se a investigação não se limitasse a uma visita fracassada ao porto. Os conflitos culturais também poderiam render risadas genuínas, se os comentários não fossem tão desrespeitosos (numa cena, Francis diz a Peri que a garota chinesa “fará o que ele quiser – dançará no carnaval, tomará cerveja, comerá cocô se ele pedir”).
Além da ingenuidade, o filme também brinca com o físico “desavantajado” das mulheres daquele país e até toca em temas como pedofilia. O estranho é que o crime sexual não é visto da mesma forma quando o homem da relação é branco e brasileiro.
Outro ponto que incomoda, talvez por pisar em calos, é o descaso com a corrupção. Quando o dono da loja descobre um ladrão entre seus funcionários, ele é convencido a puni-lo apenas “depois do carnaval”, colocando a festa em primeiro lugar.
“Made in China” pode agradar a um público acostumado ao humor de programas apelativos como Zorra Total e Pânico na TV, mas dificilmente arrancará gargalhadas sinceras. Para quem está cansado das mesmas piadas, o resultado será, no máximo, um sorrisinho nervoso e um suspiro de vergonha alheia.
Assista se você:
- Costuma gostar das comédias nacionais
- É fã de Regina Casé
- Gosta de humor politicamente incorreto
Não assista se você:
- Procura uma comédia inteligente
- Não vê graça em piadas ofensivas
- Não gosta de comédias nacionais com jeito de TV
Por Juliana Varella
Atualizado em 6 Nov 2014.