Duas meninas saem de um quarto de mãos dadas, partilhando um segredo. É festa, todos vestem branco e dançam. Há um bolo enfeitado com velas: 11 anos. A aniversariante aproxima-se da sacada, sorri e salta para a morte enquanto ninguém está olhando.
“Miss Violence”, de Alexandros Avranas, que foi sucesso na Mostra Internacional de São Paulo (2013) e vencedor do prêmio de Melhor Diretor no Festival de Veneza (2013), é o mais recente representante de “nova onda” do cinema grego – não mais tão nova, tendo começado em 2009 com “Dente Canino”, de Yorgos Lanthimos.
Num país em severa crise econômica, é comum que o cinema reaja com metáforas, espelhando a tragédia social na fantasia ou no ambiente doméstico, como é o caso de “Miss Violence” – pesado e impiedoso.
O filme nos apresenta sete personagens centrais, cujas relações de parentesco vamos descobrindo aos poucos, remontando o quebra-cabeças como investigadores buscando as origens de um crime. Além de nós, dois assistentes sociais também desconfiam da perfeição artificial daquela família.
O roteiro se preocupa mais em revelar a rotina dos sobreviventes do que em buscar informações sobre Angeliki – a garota morta. Dela, sabemos pouco ou quase nada, mas tudo de que precisamos para entendê-la está ali, entre aquelas paredes.
A mãe, Eleni (Eleni Roussinou), entra num estado de apatia, chorando escondida e descontando, eventualmente, na filha mais nova. O avô (Themis Panou) trata de levar as crianças à escola e arranjar um emprego como se a vida seguisse normalmente. Os objetos da garota são jogados no lixo.
A obsessão dessa figura paterna com boas notas e disciplina vai revelando, lentamente, uma natureza sádica. Numa das cenas mais fortes do longa, ele obriga a neta a bater no irmão, punindo-o pelo mau comportamento na escola. Enquanto isso, a avó (Reni Pittaki) observa calada e a jovem Myrto (Sissy Toumasi), de 14 anos, ameaça se rebelar, mas falta-lhe coragem.
São os detalhes – um castigo, uma porta fechada, um carro parado – que vão tornando o filme cada vez mais sinistro, até que, perto do final, a verdade se escancara obrigando o espectador a desviar o olhar. Que tipo de família é aquela?
“Miss Violence” constrói a tensão e sobre o silêncio, com a sutileza dos tons pastéis e dos sorrisos histéricos. Não é um filme fácil, tampoco gratuitamente violento, mas a realidade que ele denuncia – seja a familiar, seja a econômica – é revoltante. E causar revolta é um dos motivos pelos quais ainda se fazem filmes.
Assista se você:
- Gosta de filmes pesados, que provocam reflexão e emoção
- Quer conhecer um pouco melhor o novo cinema grego
- Gosta de dramas comportamentais, que exploram os limites das relações pessoais
Não assista se você:
- Não quer ver um filme pesado
- Não gosta de filmes dramáticos
- Não gosta de filmes europeus
Por Juliana Varella
Atualizado em 25 Set 2014.