“E quando eu acordei, eu estava só... O pássaro tinha voado”. A solidão que embala a balada Norwegian Wood, escrita por John Lennon e Paul McCartney em 1965, ainda arde como o inverno no drama homônimo que chega esta semana aos cinemas brasileiros, rebatizado didaticamente de “Como na Canção dos Beatles”.
O filme, dirigido pelo vietnamita Tran Anh Hung, não é tão novo: foi lançado em 2010 e chegou às prateleiras antes de finalmente ganhar uma chance na tela grande. Já o livro original data de 1987 e foi o primeiro grande sucesso do autor japonês Haruki Murakami.
Para um filme que leva o nome de uma canção, “Norwegian Wood” é bastante silencioso e a inspiração mal se justifica – exceto numa cena curtíssima em que uma personagem toca e canta os primeiros versos. No livro, é a música que traz ao narrador as lembranças daqueles trágicos tempos de juventude.
Trágicos e românticos, é verdade. De diversas formas, o que o roteiro nos diz é que o amor pode levar uma pessoa à ruína. Tudo começa, afinal, com um suicídio: o de Kizuki, melhor amigo de Watanabe e namorado (de uma vida inteira) de Naoko.
A história é contada do ponto de vista de Watanabe (Ken'ichi Matsuyama) – um garoto que, como outros personagens masculinos de Murakami, age como uma marionete ingênua nas mãos de mulheres que, literalmente, lhe pedem por sexo.
Fantasias adolescentes à parte, o ponto alto da adaptação é justamente uma personagem feminina: Naoko, que ganha a preciosa interpretação de Rinko Kikuchi (conhecida no ocidente por “Círculo de Fogo” e “Babel”). A atriz, muda e enigmática na maior parte do filme, é responsável pela sequência mais expressiva, quando transforma um sorriso contido em lágrimas enjauladas que, pouco-a-pouco, vencem a barreira da indiferença até jorrarem num choro desesperado e sem cortes.
O ritmo de Hung, como nessa cena, é paciente. Silêncios e longas caminhadas expressam à sua maneira uma tristeza insistente, que, apesar de cansativa para o espectador, é a expressão fiel do sentimento de luto que aqueles personagens vivenciam.
Anos depois da morte de Kizuki, Watanabe e Naoko se reencontram e se envolvem numa paixão estranha e cheia de culpa. Ao mesmo tempo, ele conhece Midori (Kiko Mizuhara), uma garota cheia de energia, mas com cicatrizes igualmente profundas. Naoko parece aceitar Watanabe para esquecer Kizuki, e Watanabe faz o mesmo com Midori, mas nada disso fica claro – o amor nunca é tão simples.
Naoko se interna num sanatório nas montanhas de onde talvez nunca consiga sair, fazendo lembrar o romance de Thomas Mann, “A Montanha Mágica”. Lá, sua depressão se reveza com momentos de amor e outros de loucura, como se todos os seus sentimentos se voltassem, a todo tempo, para a perda.
“Norwegian Wood – Como na Canção dos Beatles” tem muito pouco de Beatles, muito de Murakami e algum estilo de Hung. Da canção original, sobrou a melancolia, o frio e o pássaro que voou.
Assista se você:
- Quer ver um filme que mergulha no sofrimento humano
- Gosta de filmes de passo lento e silencioso
- Gostou do livro de Haruki Murakami
Não assista se você:
- Fica deprimido facilmente
- Passou por perdas familiares ou decepções amorosas recentemente
- Não gosta de filmes muito lentos
Por Juliana Varella
Atualizado em 30 Jul 2014.