Expectativa é o paradoxo do cinema. Todos os anos, somos bombardeados com notícias, boatos, fotos, trailers, entrevistas, até chegarmos à sessão esperando nada menos que uma experiência inesquecível. Na maioria das vezes, damos de cara com um sorriso amarelo: um “O.k., foi legal. O que vamos jantar agora?”. Mas há raras ocasiões em que o filme supera a expectativa – e te atropela, te assalta, te amarra à poltrona como se tivesse algo de essencial a dizer.
O Lobo Atrás da Porta venceu o Festival do Rio em 2013 e teve um tour bastante elogiado em festivais pelo mundo: levou prêmios em Havana e San Sebastián e integrou as seleções oficiais de Zurique e Toronto. Foi exibido na Mostra Internacional de São Paulo e logo entrou para aquele time de filmes com “grande expectativa”. E grande desconfiança também.
Um suspense nacional? Será?
Aparentemente, o suspense está na moda: Quando eu Era Vivo e Entre Nós já caminharam por essas trilhas neste ano, nenhum com tanta segurança quanto O Lobo Atrás da Porta.
Fernando Coimbra estreia na direção de longas e escolhe o elenco certo para começar: Leandra Leal, Milhem Cortaz e Fabiula Nascimento formam o trio principal: Rosa, Bernardo e Sylvia. Sylvia vai buscar a filha na creche, quando descobre que outra pessoa levou a menina. Na delegacia, ela, o marido e a amante dele são interrogados (por Juliano Cazarré, sarcástico na medida) e descobrimos, aos poucos, suas versões da história.
A parte de “quem levou a menina” é revelada rapidamente, deixando no ar os “porquês” e um cada vez mais aflitivo “para onde”. Sabemos que Bernardo considerava “rotineiro” que um homem traísse sua mulher. Sabemos que Rosa tinha apenas 25 anos, mas já sabia tomar algumas atitudes sinistras para garantir seus interesses. Sabemos pouco sobre Sylvia.
Atrás da porta
O lobo de Coimbra está dentro de casa, afagando seus cabelos. Está no Rio de Janeiro, numa estação de trem onde dois desconhecidos flertam perigosamente. Está na facilidade de se sequestrar uma criança ou na truculência de um interrogatório policial. As situações postas na mesa recheiam noticiários dia sim, dia não. (Não por acaso, o filme é inspirado num caso real.)
A trama se desenvolve numa vingança lenta, alimentada pela violência no outro. Haverá inocentes? A abordagem, surpreendentemente, evita o melodrama, a violência física ou o sexo explícito: a câmera é sutil, a sombra é protagonista, o sorriso contido e o olhar atento substituem discursos inúteis. Vamos e voltamos no tempo para acompanhar os passos daquele triângulo amoroso, ganhando informações preciosas a cada novo depoimento.
O formato não é o de quebra-cabeças, tradicional no gênero investigativo, mas é linear, apostando na tensão crescente que se sustenta até o fim. Saímos, enfim, atordoados, tocados por aquelas vidas tão cheias de si, mesquinhas e humanas demais. Saímos perturbados e satisfeitos.
Assista se você:
- Quer ver um bom suspense
- Quer ver uma atuação excepcional de Leandra Leal
- Sempre achou que essas tragédias noticiadas na TV dariam bons filmes
Não assista se você:
- Quer ver um filme leve
- Não gosta de dramas muito realistas
- Não quer ver um filme onde a criança seja a vítima
Por Juliana Varella
Atualizado em 6 Jun 2014.