Quando “O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos” chegar aos cinemas nesta quinta-feira, o público verá Thorin Escudo-de-Carvalho, um anão corpulento de cabelos longos, sobrancelhas e barba fartos, liderar seu povo numa batalha quase suicida por ouro, poder e dignidade.
Não é esse Thorin que se aproxima da mesa e nos cumprimenta, com um sorriso educado no rosto, cabelo curto e barba bem feita. Alto e bastante magro, o ator britânico deixa de lado a carapaça do rei anão e revela uma face gentil e conversadora – a de Richard Armitage.
À primeira vista, quase nada em Armitage lembra seu personagem, exceto a voz grave e a fala pausada. Aos poucos, o homem que vimos na tela vai se revelando em pequenas surpresas, como um lentíssimo erguer de olhos ou uma expressão particularmente pensativa.
O ator tem consciência de nosso espanto e conta que passou cerca de duas horas e meia por dia sendo transformado no personagem. “O primeiro teste que fizemos levou seis horas e meia, mas aos poucos, como a maquiagem foi sendo alterada e simplificada, conseguimos reduzir para duas horas e meia a três horas. A maquiagem, em si, levava uma hora e meia todos os dias, depois era meia hora para os cabelos e meia hora para o figurino” – orgulhoso, garante que a barba era natural.
“Foi uma lenta evolução no visual do personagem a partir de uma foto” – descreve – “Desde um conjunto de looks que o [estúdio de criação] Weta elaborou, passando por diferentes acessórios e possibilidades até chegar diante das câmeras. Mesmo ao longo do primeiro filme, o personagem sofreu mudanças, porque precisávamos ler muito em sua face, então a maquiagem não poderia ser muito teatral.”
Para conquistar o visual guerreiro, Armitage precisou malhar por seis meses e treinar com espadas durante oito semanas antes do início das gravações – tempo que foi estendido quando o terceiro filme foi anunciado (inicialmente, seriam apenas dois). “A transformação física foi interessante também porque precisamos reforçá-lo, fazê-lo mais largo, maior, mais musculoso, e eu sou um cara magrinho... Então isso foi um desafio”, diverte-se.
Thorin não é apenas um personagem forte, mas também é um anão – coisa que contrasta com os quase 1,90m de altura de seu intérprete. Para atingir o efeito nas telas, Armitage recorda que foram usados diversos recursos, inclusive alguns que o faziam parecer maior. “Eu tinha saltos nos meus sapatos para que, quando o computador nos encolhesse, nós [os anões] não parecêssemos crianças, mas sim guerreiros.”
Ele também explica que, em algumas cenas, dois cenários de diferentes tamanhos foram montados, para que a escala ficasse proporcional a cada personagem. Em outros momentos, diz que também usaram o bom e velho degrau. “Colocavam Gandalf (Ian McKellen) numa caixa e eu olhava para seu peito. Era mais difícil filmar quando havia outro par de olhos, especialmente um par de olhos como os de Ian McKellen. Meus olhos precisavam muito lentamente se levantar em direção aos dele, que são como ímãs” – conta, sem esconder seu lado fan-boy.
Além de admirar McKellen, Armitage revela que é fã da obra de Tolkien e que “O Hobbit” foi provavelmente o primeiro livro que leu sozinho quando criança. Ao abrir a porta redonda no Condado e dar de cara com o veterano vestido de mago, portanto, sua reação foi de puro choque. “O que estou fazendo aqui, brincando no parque temático de O Senhor dos Anéis?” – para ele, era a realização de um sonho.
Embarcado nesse projeto de corpo e alma, o ator sabia que precisaria ser fiel ao material original para agradar aos outros fãs. “Eu sempre recorria ao livro, quando me sentia perdido ou achava que estava enfeitando demais”, afirma, respeitoso. “Buscava as passagens em que Tolkien faz um perfil mais preciso de quem Thorin é, em particular um trecho em que ele faz um longo discurso. A descrição física é um pouco genérica e, quando se interpreta um personagem diariamente por 240 dias, o mais específico que você conseguir chegar, melhor, mas todo o meu material de referência, de pesquisa, sempre foi Tolkien.”
Peter Jackson, diretor dos três longas e também da trilogia “O Senhor dos Anéis”, também fez sua parte para ajudar os atores a embarcarem em seus personagens. “Foi num dos primeiros dias. Cheguei à base e havia uma fila de helicópteros, e você ouve as histórias lendárias de Pete filmando em locações inacessíveis, então eu sabia que estávamos indo a algum lugar bem especial. Então você entra no personagem, entra no helicóptero, e te levam para o topo de uma montanha, deixam você lá e vão embora. E ficamos lá, esperando a filmagem, e foi inesquecível. Nos tornamos os anões na montanha.”
Ao longo dos três filmes, a experiência deixou lições importantes para o ator, como a paciência para interpretar um personagem durante um longo período, revelando-o aos poucos antes do clímax no episódio final. Armitage também descobriu o carinho dos fãs e se apaixonou pelos cosplayers que invadiram pré-estreias e eventos como a Comic Con Experience, em São Paulo. “Acho fantástico, fico imaginando quais fantasias irei encontrar.”
Agora que a jornada acabou, ele levará para casa apenas um anel dourado, de anões, cravado com o nome de seu personagem do lado de dentro. Um pequeno segredo só seu, para lembrar ao Richard de que, um dia, ele foi Thorin Escudo-de-Carvalho.
Por Juliana Varella
Atualizado em 9 Dez 2014.