Affonso Beato e o diretor George C. Wolfe em Noites de Tormenta. |
O que há em comum entre o cineasta brasileiro Glauber Rocha, de O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro, o americano Jim McBride, de A Fera do Rock, e o espanhol Pedro Almodóvar, de Tudo Sobre Minha Mãe? Apesar de parecerem não ter muito em comum, os três trabalharam com o diretor de fotografia carioca Affonso Beato em seus filmes. Morador dos EUA desde que precisou deixar o Brasil por causa da ditadura, o fotógrafo está atualmente no Rio de Janeiro, para lançar seu novo filme Noites de Tormenta, no Festival do Rio, além de trabalhar na minissérie Maysa, da Rede Globo.
Apaixonado por arte, ele queria ser um artista plástico na juventude, mas acabou partindo para a fotografia, trabalhando em um jornal. Ao conversar com um amigo, o cineasta moçambicano Ruy Guerra, ele confessou admirar o trabalho do argentino Ricardo Aronovich. Naquele momento, Guerra estava justamente aguardando Aronovich para filmar seu clássico Os Fuzis, de 1964, e convidou Beato para trabalhar como assistente de seu ídolo. Depois da experiência, o jovem decidiu seguir carreira como diretor de fotografia e começou a participar de curtas de Arnaldo Jabor, Júlio Bressane e Antonio Carlos da Fontoura, com quem fez também seus primeiros longas.
No final daquela década, Affonso Beato já era respeitado em sua profissão, tanto que até um desafeto seu pediu conselhos para o próximo filme. Glauber Rocha, já conhecido em festivais de todo o mundo, não se dava bem com o fotógrafo, mas pediu sua ajuda para uma cena de O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro. O cineasta baiano gostou tanto do que ouviu que deixou as rixas de lado e o chamou para trabalharem juntos. O longa foi um sucesso, chegando a ganhar o prêmio do júri no Festival de Cannes. Ainda hoje, mesmo com inúmeros trabalhos internacionais, este é o que mais chama a atenção dos cineastas com quem vai trabalhar.
Cecilia Roth em Tudo Sobre Minha Mãe, de 1999, terceiro trabalho de Affonso Beato com Pedro Almodóvar. |
Casado na época com uma funcionária do Itamaraty, Affonso aproveitou o fato quando sentiu que o Regime Militar estava dificultando a vida artística no Brasil. Neste momento, ela conseguiu uma transferência e foram morar em Nova Iorque por alguns anos. Este tempo, porém, durou mais do que ele poderia imaginar, e ainda hoje Beato se divide entre EUA, Europa e seu apartamento na Gávea, no Rio de Janeiro. Após fazer filmes para a França, Chile e Alemanha, o carioca conheceu um de seus principais parceiros, Jim McBride, com quem fez 13 trabalhos, dentre eles A Fera do Rock, biografia de Jerry Lee Lewis, com Dennis Quaid.
Outra parceria de sucesso na carreira de Affonso foi com o cultuado cineasta espanhol Pedro Almodóvar. Após lançar seu filme Kika, que não foi bem em relação aos anteriores por conta de seu exagero, o diretor precisava mudar. Pedro estava com um problema, já que queria um fotógrafo que soubesse controlar as cores, coisa rara de se achar na Europa. Um amigo em comum sugeriu Beato e quando Almodóvar soube que se tratava do diretor de fotografia de O Dragão da Maldade, se interessou. Perfeccionista, o espanhol passou cinco dias conversando com o brasileiro para, enfim, acertar o projeto de A Flor de Meu Segredo.
Helen Mirren em A Rainha, de 2006, papel que lhe rendeu o Oscar de melhor atriz. |
O resultado agradou ao diretor, que ainda chamaria o fotógrafo para seus dois próximos trabalhos, Carne Trêmula e Tudo Sobre Minha Mãe, título que marcaria o nome do realizador entre os principais do mundo e pelo qual ele ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro. Naquele mesmo ano, Beato realizaria no Brasil o filme Orfeu, de Cacá Diegues, seu amigo de juventude, com quem fez mais tarde também Deus é Brasileiro. Os dois filmes, juntos, fizeram quase três milhões de espectadores no Brasil, um valor altíssimo considerada a má fase do cinema nacional.
Affonso Beato trabalharia ainda com brasileiros em suas carreiras internacionais. Fotografou Água Negra, de Walter Salles, e Voando Alto, de Bruno Barreto, com quem já havia feito Além da Paixão, 18 anos antes. Em 2006, o Oscar rondou novamente um trabalho do carioca. A Rainha, filme que fez com Stephen Frears sobre a rainha Elizabeth, foi indicado a seis prêmios, vencendo o de melhor atriz. Nos últimos dois anos ele trouxe para o Festival do Rio suas novidades. Em 2007 foi O Amor nos Tempos do Cólera, e agora vem com Noites de Tormenta, drama romântico com Richard Gere e Diane Lane.
Atualizado em 6 Set 2011.