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- Alô?
- Oi Marise, tudo bem? Sou um possível cliente.
- Oi querido, no que eu te ajudo?
- Tenho um sonho Marise, será que você o realiza?
- Ligou para o número certo abençoado, aqui fazemos de tudo, por tudo e em tudo!
- Então Marise... posso falar mesmo? Você faz de tudo?
- Claaaaaro... pode pedir que fazemos qualquer negócio (às vezes eu tenho dúvida se minha origem não seria judia).
- Vou falar, hein?... Desde que me tornei guri eu penso em realizar esse sonho e até hoje não encontrei nenhuma menina que realizasse, então resolvi contratar uma profissional.
Lá eu fiquei já imaginando que vinha bomba pela frente. Se nenhuma menina quis realizar sua fantasia e pelo que tudo indicava, ele estaria ainda na flor da idade, só podia ser mais um desejo escabroso que até as minhas mãos chegava. Apenas me redimi, em pensamentos, já fui me dizendo que na profissão é assim mesmo e que tudo eu deveria ouvir, atender, agüentar, suportar e às vezes até padecer.
Uma espécie de juramento, igual ao de um médico quando ele se forma: "Prometo atender a todos, me dedicar, não fazer diferença entre cor, credo de meus pacientes e blá, blá, blá".
E eu me preparei para ouvir mais uma vez algo fora do comum:
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- Pode abrir teu coração, fala o que tu queres com todas as letras, não tem problema não, aqui os ouvidos estão abertos para receber qualquer coisa.
- Eu tenho vontade de sair com uma mulher vestindo espartilho!
- Sim e o que mais?
- Espartilho vermelho!!!
- E...
- Atrás tem que ser fio dental!
- Sim, todos são fios dentais (alguém já viu espartilho de calcinha larga?).
- E ela tem que estar bem cheirosa.
"Óbvio, fedorenta ninguém vai atender ninguém, nós não temos "moral", mas somos bem limpinhas!"
- Sim e o que mais querido?
- Acho que mais nada não... hummm, acrescenta aí fazer boca sexy durante o ato de amor.
"Durante o ato de amor? Esse cara é de que planeta?"
- Tudo bem, isso tudo está na mão já! Mas é só isso que você deseja durante o ato de amor? Não tem assim algo do tipo picante que você gostaria de fazer? Quem sabe experimentar um vibrador, um anel peniano, duas garotas de espartilho etc.
- Não, não Dona Marise, só isso e um clima romântico no quarto já me basta.
"Gostei do respeito, Dona Marise, to ficando importante!"
- Vou te passar a localização do motel. Para clima romântico cobro mais caro, sabe como é, tem que se dedicar mais.
- Tudo bem, eu pago mais, mas tem que beijar na boca.
- A mãe não beija na boca não, filho.
- Mas aí não tem clima romântico Marise!
"Moleque tá querendo love story!"
- Ta bom então, mas cobro "cinquentinha" a mais pra beijar na boca, viu? E tem mais, cobro tudo antecipado na tua chegada!
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Preço acertado, endereço anotado, rapaz educado e horário marcado. Eu de espartilho vermelho, largada em cima da cama fazendo boca sexy e esperando ele entrar no quarto. Música de fundo, cenário romântico, vela acesa e banheira cheia.
Chega o "meu filho": Muito magro, bem alto, encurvado, narigudo, olheiras fundas, olhos saltados, dentuço, cabelo duro, pescoço curto e uma boca enorme cheinha de dentes acavalados dispostos a me beijar. Estática, uns cinco segundos.
Ele ficou me olhando com a maior cara de satisfação do mundo que um rapaz pode ter, colocou a mão no bolso e me mostrou sorrindo o dinheiro na mão.
Daí é que eu despertei do choque.
"Te liga Marise, reage, faz teu papel!!!"
Chegou a hora do incesto. Fiquei de pé na cama, comecei a dançar no embalo da música, virei de costas para que ele visse o tão sonhado fio dental enquanto eu me recuperava melhor, desci rebolando até embaixo, curvei a cabeça em direção à cama e subi com as pernas retas. Resolvi encarar a situação de frente, me virei já com cara recomposta do susto e chamei ele para junto de mim, que grudou no meu corpo, enquanto eu aproveitava para tirar o dinheiro da mão dele. Ao beijar o meu pescoço, me fez arrepiar (não sei bem até hoje qual dos dois motivos foram, se pelo dinheiro ou pela aparência aterrorizante) e então me beijou na boca, de forma ardente enquanto eu contava os segundos para me distrair e esperar aquele tempo que iria parecer uma eternidade passar... 1, 2, 3, 4, 5...
E para fechar todas, depois de despido, ainda noto que ele tem o documento bem fino, de tamanho médio, quase pequeno, torto no ápice e deslocado na base.
E que papai do céu continue abençoando todas as empresárias da noite das doces fábricas de realizar sonhos, porque minhas queridas e meus queridos, lhes digo, tem coisas que se não for a gente ninguém mais faz.
Quem é a colunista: Vanessa de Oliveira
O que faz: Escritora, ex-garota de programa, enfermeira e empresária da linha de Lingerie Vanessa de Oliveira.
Pecado Gastronômico: Assumo, confesso e nego tratamento: sou compulsiva por comida, estou sempre comendo, na cama, na frente do micro, enquanto dirijo... e quase tudo tem chocolate.
Melhor Lugar da Cidade: Parque do Ibirapuera.
Para Falar com Vanessa: acesse o blog da autora
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Atualizado em 6 Set 2011.