Guia da Semana



Dos estúdios de televisão para as bancadas da Câmara Municipal de São Paulo, Soninha Francine sempre gostou de meter o nariz em território masculino. Após ter se tornado uma das primeiras comentaristas de futebol brasileiras, a ex-VJ da MTV decidiu colocar seu senso de justiça em prática e se candidatou na última eleição para a Prefeitura da cidade, ano passado, quando terminou em 5º lugar, correndo pelo PPS. Enquanto ainda não chega ao executivo, Soninha vem mostrando a força feminina na política em seu mandato como vereadora e subprefeita da Lapa. Confira abaixo o que ela tem a dizer sobre as conquistas e os desafios das mulheres brasileiras.

Guia da Semana: Como você enxerga os direitos femininos atualmente?
Soninha Francine: Em geral melhorou muito, e rápido. Se você pensar, na minha geração, na 8ª séria ainda se debatia se a mulher deveria ou não trabalhar fora de casa. Não se discutia se a mulher devia se casar, porque esse era considerado um objetivo natural. Mas a gente continua tendo problemas, pois o que era um direito duramente conquistado, acaba virando uma imposição. Uma mulher que afirmar que sua idealização é apenas cuidar bem dos filhos, vai ser considerada uma pessoa inadequada. Mesmo o direito a uma vida sexual prazerosa e saudável, também virou um imposição. Meninas de 13 e 14 anos ficam aflitas para saber quando é que vão perder a virgindade, não necessariamente para ter prazer, mas por uma afirmação social. Existem as conquistas reais e aquelas que depois de conquistadas, foram distorcidas.

Guia da Semana: Você trabalhou durante muito tempo como comentarista esportiva. Acha que as mulheres estão ganhando mais espaço nessa área?
Soninha: Não tenho a menor dúvida. Vai chegar um dia em que a mulher não vai mais ser tema de debate, se pode ou não pode trabalhar com futebol. Vai ser tão natural quanto comentar política e economia, o que também era considerado muito esquisito há uns anos atrás, parecia que a gente estava invadindo um território masculino.

Guia da Semana: E na política? Você ainda sente discriminação?
Soninha: Existem alguns lugares no Brasil onde tudo continua sendo mais difícil. Não é o mundo todo que está no mesmo pé da história. Em algumas situações ainda somos vistas como intrusas. Na política, infelizmente, existem mecanismos para não modificar a situação. Quem já esta no poder, tem muito mais facilidade para se manter ali. A disputa não é leal. Então, o fato de 90% dos mandatos eletivos ocupados por homens é uma brutalidade. E não é porque são homens. Simplesmente eles já estão lá e tem mais facilidade para continuar. A evolução feminina na política andou menos do que nas outras áreas.

Guia da Semana: Com a candidatura de uma mulher para a presidência, você acha que isso pode mudar?
Soninha: Não. Uma mulher candidata à presidência também não adianta, é pouco. São Paulo já elegeu duas mulheres prefeitas e a primeira delas foi muito marcante. O PT ainda tinha muita dificuldade de ganhar eleições executivas, então uma mulher (Luiza Erundina), petista com toda uma carga de preconceito, que despejavam nela por ser nordestina e tudo mais, se elegeu. A Marta também, com toda carga de preconceito como perua e burguesa, também se elegeu, mas nem por isso a Câmara Municipal é mais equilibrada na divisão entre homens e mulheres. Elege-se a Marta, mas ainda continua tendo-se apenas cinco ou seis vereadoras, num universo de 55. É legal ver mulheres disputando esses cargos, mas não muda o panorama.

Guia da Semana: Você acha que ainda há diferença entre os sexos na hora de assumir um cargo de chefia?
Soninha: Existe, no mínimo por força da circunstância. Exatamente porque os homens já estão há mais tempo, então se acostumam a determinar modos e procedimentos, recorrem facilmente a truculência. Foram eles que inventaram esse modo de fazer as coisas e as mulheres como estão chegando de fora, estão chutando a porta, invadindo com esse olhar de quem vem fora. Elas têm uma tendência maior a questionar as estruturas, pois não foram elas que as construíram. Não é necessariamente porque mulheres são melhores que os homens, mas porque o ponto de vista é outro.

Guia da Semana: Como é ser mulher no século XXI?
Soninha: É tão complexo como todas as outras coisas. A gente continua lidando com estereótipos super antiquados, da mulher gostosa e burra, objeto de consumo, o carro e a cerveja, tudo no mesmo patamar. Tem esse estereótipo ridículo e antiquado e se não tomar cuidado, ele confronta o da mulher empreendedora, de cara amarrada, intransigente, inflexível... Isso é uma bobagem. A gente não precisa combater um estereótipo com outro.

Guia da Semana: Qual é ou foi o grande desafio da sua vida, como mulher?
Soninha: Certamente a maternidade antecipada. Eu queria ser mãe, sempre soube disso, nunca tive a menor dúvida, mesmo tendo milhões de plano pra vida. Mas eu fui antes do que eu esperava - engravidei da minha primeira filha com 15 anos e da segunda com 18. Eu adorava ter filhos, mas conciliar isso com tudo mais que eu queria fazer na vida foi bem sofrido. Foi difícil até mesmo no relacionamento, que não era com um brucutu. Mas mesmo assim, quando os dois estão na rua, o filho é problema da mulher. Ela tem que arrumar escolinha, ver se tem alguém para buscar o filho... É impossível realizar tudo o que se quer, mas de jeito nenhum a maternidade frustrou meus sonhos. Eles apenas tiveram que mudar um pouco de hora e de lugar.

Bate-Bola
Cor: Hoje vermelho, mas amanhã pode mudar
Hobby: Ler e escrever
O que te tira do sério: Gente folgada é uma forma muito incômoda de injustiça.
Cantor: Jack Johnson, conforme o estado de espírito
Cantora: Nora Jones
Pecado gastronômico: Eu comeria pizza todo dia à noite, antes de dormir, e requentada no dia seguinte de manhã
Bebida: Água
Ídolo: Muda todo dia. Na política gosto do Eduardo Jorge
Defeito: Bagunceira
Qualidade: Obsessão por justiça
O que mudaria em você: A voz. Acho ela muito irritante
Sonho de consumo: Uma casa com quintal
Ser mulher para você é: Uma delícia
Frase: A gente tem mais liberdade e poder do que usa


Atualizado em 1 Dez 2011.