Guia da Semana

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"Ela largou tudo: diploma na mão, um emprego bom, família, noivo e amigos. Foi para a comunidade em São Mateus (periferia de São Paulo). De lá foi transferida para Campo Mourão, no Paraná. Resolveu ser freira para ter contato com a comunidade pobre, fazer caridade, ajudar."

Quem está contando a história é Louise Emille de Carvalho Guimarães, irmã da freira Michelle Marie, que largou o namoro de quatro anos com aliança dourada no dedo para seguir uma vontade que tinha desde os 17 anos. Mas ela não é a única. A novidade da vez é a modelo Kate Moss, que cogitou passar as férias num convento, para se purificar. Logo, ela mudou de idéia e foi parar na Riviera Francesa.

Na verdade, não é tão simples assim entrar na instituição. Existem regras a serem seguidas cautelosamente. Primeiro, é preciso que a garota passe pelos encontros vocacionais, onde vai questionar se é isso mesmo que quer da vida. Essa primeira fase é denominada aspirantado. Ao procurar pela instituição religiosa com o objetivo de ingressar nela, a jovem deve apresentar documentos civis, religiosos, acadêmicos, de sanidade e conduta.

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Irmã Diane Clay Cuntiff


De acordo com a Irmã Diane Clay Cuntiff, da Congregação das Irmãs de Santa Cruz, é comum observar mulheres de 16 a 25 anos nessas reuniões, onde elas conhecem o carisma da congregação, que inclui espiritualidade, missão e estilo de vida. O carisma da Irmã Diane, por exemplo, é trabalhar a serviço das necessidades do povo e da igreja, através de educação (Colégio Santa Maria) e serviços diretos de ajuda à pessoa carente.

Depois disso, a pessoa é convidada a passar um tempo com as irmãs, para conhecer o dia-a-dia e o trabalho que é realizado por elas. Esse é o postulado, um processo de entrada na vida religiosa. As candidatas ficam de seis meses a dois anos fazendo visitas à comunidade, promovendo assim um auto-conhecimento em relação as suas vontades e habilidades, tanto profissionais como pessoais.

Eis que chega o noviciado. Durante dois anos a mulher se torna noviça, fazendo o aprofundamento dos votos, carisma e trabalho dentro do convento (de acordo com aquilo que escolheu).

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Irmãs do Colégio Santa Maria


Depois da longa jornada, vem o passo final, onde serão confirmados os votos religiosos através de três etapas: primeira profissão religiosa, Juniorato e a Consagração definitiva (votos perpétuos). Pronto! A mulher agora é uma freira.

"O objetivo central do processo formativo de cada Instituto Religioso é a preparação da pessoa para a Consagração de si mesma a Deus, no seguimento a Jesus Cristo, para continuar Sua missão no mundo, conforme o Carisma do Instituto que a jovem escolheu", explicam as irmãs e assessoras executivas da Conferência dos Religiosos do Brasil - CRB, Maria Helenita e Bernadete Gaspar.

Apesar de passar por tantas etapas, a pessoa corre o risco de arrepender-se da decisão. Nesse caso, há alguns passos a serem seguidos. A princípio, um processo de discernimento será acompanhado pela irmã responsável, com ajuda psicológica e espiritual, caso seja necessário. Isso demora de um a três anos e, uma vez tomada a decisão, ela será apresentada com os devidos motivos para o Conselho Provincial, que encaminhará o documento para o Conselho Geral da Congregação.

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Se a escolha for durante o juniorato (votos temporários), o próprio Conselho Geral poderá fazer a liberação. Caso a irmã já tenha dado seus votos perpétuos, então o pedido é encaminhado à Sé Apostólica, em Roma, de onde virá a assinatura final para o desligamento.

É importante ressaltar que existem diferentes tipos de convento. A Vida Religiosa Consagrada Apostólica ou Ativa engloba comunidades residentes em casas comuns, com atuação em colégios, hospitais, obras sociais, pastorais e profissões liberais. Nesse caso, as irmãs possuem um regime aberto, através do trabalho pastoral. Ou seja, elas têm contato com as outras pessoas, inclusive familiares, e possuem uma rotina de serviços a serem prestados para a população.

Já a Vida Religiosa Consagrada dedicada à Contemplação acontece dentro de mosteiros, em regime de clausura, onde as irmãs são designadas à oração e não têm contato com outras pessoas.

A fé no Brasil

Hoje, no Brasil, dados do IBGE e CERIS 2005 (Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais) apontam um total de 34.697 religiosas, contra 11.577 religiosos. Além disso, são 494 institutos femininos e 137 mosteiros femininos dedicados à contemplação em clausura (correspondendo a cerca de 14 institutos).

As irmãs Helenita e Bernadete lembram que "a tendência maior dos tempos de hoje é a busca de novas formas de vida religiosa, mais livres, menos estruturadas e sistemáticas. Por outro lado, as pessoas gostam de sinais externos e de emoções, daí as vestes e estilos de rezas mais devocionais. Nos Institutos de Vida mais comprometidos com o social e a profecia, chegam muitas jovens, mas poucas permanecem". De qualquer forma, o regime de clausura é muito procurado por mulheres de 25 a 30 anos.

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A religião nasce de questionamentos em relação à própria existência, medos e preocupações. Hoje, as pessoas mudam de crença com freqüência, em função dessa busca por respostas, que muitas vezes não são encontradas em determinada fé.

A psicóloga e psicanalista Thalita Freire-Maia acredita que a importância da religião se dá por oferecer uma base ética aos indivíduos, com suporte de crenças e valores que visam o crescimento humano. É como se as pessoas buscassem um sentido para a própria vida, libertando-se de medos e inseguranças.

A mudança radical no estilo de vida de algumas pessoas pode ser considerada um verdadeiro chamado, uma vocação, o que pode gerar incertezas, dúvidas e questionamentos que devem ser resolvidos antes de qualquer tomada de decisão.

"Isso pode ser também pelo próprio medo e insegurança de não saber quem é, não saber discernir sua identidade pessoal e profissional, não reconhecer seus gostos, interesses e motivações, gerando angústia. Nesse caso, a pessoa deve ter cuidado para não ser levada a tomar decisões precipitadas, por impulso, pautadas mais na fantasia do que na realidade", completa a psicóloga.

Caso a escolha não seja feita com a certeza necessária, pode causar frustração, decepção, sentimentos de culpa e fracasso, influenciando de forma negativa em outros aspectos da vida.

Para passar uma "temporada espiritual", clique aqui e saiba como funciona um retiro.

Colaboraram:
? Irmã Diane Clay Cuntiff
? Conferência dos Religiosos do Brasil
? Thalita Freire-Maia

Atualizado em 6 Set 2011.