A devoção crescente e initerrupta a Elvis Presley, que deve ter comemorado 76 anos em janeiro em algum lugar do planeta (teorias não faltam) é um dos motivos, mas não o único. Para além do rei do Rock 'nd roll, a cena rocker se atualizou e ganhou novas colorações, sem perder a aura de que os bons tempos - se não voltam - podem ser sempre revisitados.
Tudo começa com a proliferação do rockabilly, estilo representante de toda uma cena musical norte-americana da época, do mais antigo rhythm & blues ao início da surf music, de 1960. A popularidade de Elvis e do ator James Dean, protagonista do filme Juventude Transviada (1955), ajudaram a construir a imagem do rocker: o jovem que curte uma boa música enquanto dá um trato no carro customizado para sair para beber com a turma e impressionar as pin ups, as meninas de saia rodada e decotes maliciosos, na balada de mais tarde.
"Nasci rocker, e isso aflorou no dia em que eu coloquei o topete na cabeça e carreguei minha jaqueta preta nas costas. Na hora, atinei e senti falta de um possante carro", conta Victor Rodder. Sua iniciação foi aos 16 anos e, como na maioria dos casos, começou com Elvis. Hoje, esse curitibano de 37 anos faz parte da turma Rebels, é saxofonista da banda Annie & The Malagueta Boys e viaja com Mike, nome de batismo do envenenado Ford 1951, para feiras de carros antigos.
Entre a Old School...
Assim como góticos, punks e a galera do metal, os rockers também são uma tribo roqueira underground cheia de particularidades. A música é o botão de ignição da maioria dos integrantes. Apesar de cultuar o som de Elvis e de outras bandas e astros dos anos 50, o movimento teve o seu boom no Brasil na década de 80 por conta do sucesso do Stray Cats e outros estrangeiros do neo-rockabilly. Outro braço do movimento vem do flerte dos punks, então no auge, com parte dos rockers (e vice-versa), surgindo um novo gênero, o psychobilly.
Foto: Acervo pessoal
A turma dos Ratz numa festa no Hotel Cambridge
Depois do som, vem o visual marcado pelo xadrez, couro e jeans (homens), vestidos e fitas (mulheres) e muita brilhantina. Já montado, o rocker parte em busca das baladas da tribo e, ao conhecer melhor as turmas (ou gangues, termo hoje considerado pejorativo), se identifica e se aproxima de uma delas para fazer parte. Em aceito, passa a usar as tatuagens e jaquetas que distinguem umas das outras.
Assim foi com Leandro Clérigo, mais conhecido como Leandro Rocker. Dos discos de Elvis na juventude, logo conheceu outras bandas, tornou-se DJ e passou a integrar a turma dos Dogs, uma das mais antigas de São Paulo. Usando coturno e camisa branca justa que destaca os músculos, ele garante que o visual faz parte da filosofia, mas garante que não há a mítica de violência que envolve as turmas undergrounds. "O rocker, por natureza, é agressivo, pois é de uma tribo surgida nas ruas e nos porões. De fato, a galera não vai pra igreja rezar. Mas respeitamos os outros que não vivem o nosso estilo saudosista", destaca.
... e os bambolês
Mesmo sendo um autêntico rocker, Leandro anima a noite da paulistana The Clock às sextas e sábados. O surgimento dessa casa e de outras do gênero, como a catarinense Ooby Dooby Rock Café, junto com o aumento de festas temáticas em clubes de rock em geral, vêm trazendo uma nova turma de simpatizantes para cena. "As novas casas e festas temáticas estão fazendo sucesso porque ocupam um espaço vazio, oferecendo música e diversão para quem não é rocker, que, cá entre nós, costuma ser mal visto nas festas fechadas do movimento", argumenta.
Os autênticos que não gostam muito dessa mistura apelidaram os novatos de 'a turma do Bambolê'. Rocker das antigas, Eric Von Ziper não vê problemas nesse encontro. "Tudo que venha em prol do Rock' n' roll e do resgate dos anos 50 é bom". Ele é fundador dos Ratz, criados em 1981, e do The Rock' n' Roll Club do Brasil, lançado em 1988. Atualmente, Ziper comanda o Rockarama, programa de tevê na web voltado ao universo, além de realizar mensalmente uma festa de mesmo nome.
Aos 34 anos e com um filho de 10, Priscila Escudero descobriu o universo rocker nas festas do The Rock' n' Roll Club do Brasil há seis anos e entrou de cabeça na onda, chegando a fazer parte dos Deuces, uma turma mista. "Como gosto de ver muita gente junta e de vários lugares, preferi me desligar". A rocker também acha ótima a divulgação e mistura de tipos, mas torce o nariz para aqueles que não respeitam o movimento. "Acho que todo mundo curte um pouco dos anos 50, mas ser rocker não é sair fantasiado para dançar de vez em quando", deixa bem claro.
Surfando na moda
Foto: Acervo The Clock
Jovem de todos os tipos dançando no The Clock
Aberto em 2005, o The Clock é um dos estabelecimento dedicado totalmente ao gênero na capital paulistana. "Nosso maior público é de simpatizantes, gente curiosa que soube da casa, veio conferir e volta e meia dá uma passada", explica o gerente Giuliano Garbi. Esse psicólogo de 32 anos largou as consultorias em empresas para auxiliar no projeto e dar aulas de dança rockabilly. Em dois anos, já foram 800 alunos que passaram pelo curso de três meses oferecido na casa, além de um incontável público que aprende o passo-base e os cinco giros iniciais (Abraço, Homem, Triplo, Passeio e Coca-Cola) ensinados por ele e Marina Temple, sua parceira de salão, nas noites do final de semana e nas eventuais domingueiras.
A casa lota de jovens num ambiente tão tranquilo, tão família, que até mães como Geni Vanzo vão. Ela acompanha quase sempre a filha Verônica, que comemorou seu aniversário de 15 anos no salão da balada. "Eu também gosto do som e aqui fico tranqüila, pois sei que ela está num bom ambiente".
No The Clock há uma pequena loja onde Priscila Escudero põe seus biquínis demais peças da coleção de moda praia de sua marca, a Prin Up, à venda. "Acho mais sensual esconder do que mostrar. Isso é a pin up, a moça que traz essa sensualidade à flor da pele e nos gestos, mas não de forma escancarada", comenta a estilista, que analisa o crescimento da cena: "Essa moçada mais nova está descobrindo o rock e se cobrindo mais", brinca.
Opinião compartilhada por Alex Valenzi, o músico lá do início do texto, que divide com Henry Paul Trio a referência entre as bandas de rockabilly na cena brasileira. Aos 41 anos, ele é o líder da banda Alex Valenzi e the Hide-a-way Cats, que excursiona pelo mundo em festivais rockers e já abriu as apresentações do cantor Jerry Lee Lewis (do autor de sucessos como Great balls of fire) no Brasil. "O movimento cresceu bastante e queremos mais, pois quanto mais bandas houver, mais a cena vai deslanchar", conta o vocalista e pianista que faz uma mistura de boogie woogie, rock' n' roll tradicional e pitadas de doo wop e R&B. Mais rockabilly impossível.
Fotos Álbum: Gael Oliveira e acervos pessoais dos entrevistados
Arte: Fernando Kazuo
Atualizado em 6 Set 2011.