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Muito se lê por aí que para um relacionamento "dar certo" - expressão muito vaga, por sinal - é preciso levar ao pé da letra tudo o que as revistas femininas cansam de repetir, como se fosse uma lavagem cerebral. "Respeite o espaço dele, não sufoque, não grude, não seja ciumenta, não implique com o futebol dele com os amigos toda quarta, não ligue a cada cinco minutos quando ele estiver na happy hour com o pessoal do trabalho (e em nenhuma outra ocasião), em hipótese alguma abra a boca enquanto ele assiste ao jogo do Timão (ou do Verdão, do Tricolor ou seja lá qual for), aprenda (e faça) um milhão de truques e ´técnicas´ sexuais, jamais apareça na frente dele com máscara de pepino no rosto, não ronque, esteja s-e-m-p-r-e bem cuidada, seja P. (%#$) na cama e lady na sociedade, além de carinhosa, gostosa, sexy, companheira, inteligente, boa dona-de-casa (e de cama), cozinheira de mão-cheia e blá-blá-bá". Em suma, seja um robô. Meu conselho: seja você mesma.
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A maior praga comportamental é o narcisismo crônico gerado por uma gritante insegurança - camuflada, claro. Ele não permite, em hipótese alguma, que n-a-d-a abale o ego. E o que mais ameaça essa palavra tão pequena e de vasta complexidade - "ego" - é, contraditoriamente, o sentimento Verdadeiro (assim mesmo, em caixa alta) por outra pessoa. O Amor alimenta e destrói o ego. Nos presenteia com sorrisos sem motivos, brilho nos olhos e deliciosas caras de "paisagens" mesmo nos dias de TPM aguda (tá, tudo bem, na TPM é exagero). O amor torna quem ama vulnerável. E tornar-se vulnerável é a total arruinação do ego. E conseqüentemente do amor, no caso dos covardes.
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Bom mesmo seria se todos nós nos sentíssemos confortáveis sendo vulneráveis a outra pessoa. É por isso que, parafraseando Arnaldo Jabor, "Amar exige coragem e hoje somos todos covardes". O distorcido receio em perder a própria identidade num relacionamento não revela medo do outro e sim, de nós. Não de quem nos mostramos exteriormente, mas de quem somos em nossa tão sigilosa e supostamente secreta, essência.
Tememos soltar nossas amarras interiores. Vestimos armaduras, tão duras, que escondem o que temos de melhor e de mais belo. Nos defendemos de quem não nos ataca. Atacamos, por defesa, quem nos liberta. Ou poderia nos libertar. Vivemos num eterno baile de máscaras, dançando em pistas abarrotadas de fugitivos em busca de efêmeras e fantasiosas amnésias para saciar o nosso vazio existencial. E real.
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Ao nos olharmos no espelho, vemos fantasmas. Somos desconhecidos de nós. Atuamos numa incessante peça de teatro, representando personagens difusos nos palcos da vida real. Esquecemos a Arte e nos vendemos ao ínfimo "amor" comercial. Perdemos as lentes de contato que antes nos permitiam, talvez, vermos as belezas escondidas nas almas despidas enquanto vestidas.
E de montagem em montagem, classificadas de comédias românticas (ou seriam medíocres?), permanecemos numa infindável retaguarda, com medo de sentir medo no futuro que depende do agora. Tolo e desnecessário medo que nos assombra com a fictícia "ameaça" da não-representação, ausente de figurinos, cenários e personagens. Tememos contracenar com a realidade do amor espiritual o bastante ao ponto de descobrir e nos revelar quem, no fundo, mais tememos conhecer: nós mesmos.
Como já filosofava Nietzche, "Cada um é para si, o mais distante. O inimigo mais perigoso que você poderá encontrar será sempre você mesmo". Grande sábio!
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Quem é a colunista: Milene Spinelli, infinita, múltipla e única.
O que faz: vive (no sentido literal da palavra). Ah, também é jornalista e apaixonada pela profissão.
Pecado gastronômico: doce de leite.
Melhor lugar do Brasil: Brasil? Prefiro o Universo!
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Atualizado em 6 Set 2011.