Confúcio
Um estudo recente desenvolvido pela psicóloga e professora associada da Fundação Dom Cabral e mestre convidada da Insead (França) e da London Business School, Betania Tanure, aponta que 84% dos executivos são infelizes no trabalho. Realizada com mais de mil executivos de aproximadamente 350 empresas no Brasil, revela que embora sejam bons administradores nos negócios, os executivos são péssimos administradores de suas próprias vidas. 58% estão descontentes com o ritmo excessivo de trabalho e 54% estão insatisfeitos com o tempo dedicado à vida pessoal.
O executivo brasileiro trabalha em média 14 horas por dia, e mesmo sabendo que o tempo restante é insuficiente para dedicar à vida pessoal, ele não consegue se desligar do trabalho, o que o caracteriza como workaholic - realizado profissionalmente, mas pessoalmente infeliz. Os workaholics são viciados no trabalho e não vêem outros sentidos na vida que não seja o exercício profissional, deixando em segundo plano a família, amigos e até a própria saúde.
A jovem analista H.A. trabalha na área de mercado financeiro e seu horário, na teoria, é das 9h às 18h, mas na prática, das 9h às 23h30, em média. Ainda trabalha durante quase todos os finais de semana, cerca de quatro ou cinco horas. Nem sempre o excesso de trabalho é sinônimo de boa vontade ou prazer pelo que faz. Apesar disso, H.A., há apenas oito meses no emprego, declara "Adoro o que faço. Se não gostasse, não seria capaz de dedicar tantas horas do meu dia." Atitude que aparentemente pode ser confundida com dedicação extrema, a compulsividade pelo trabalho pode trazer riscos à saúde. Quando o trabalho deixa de ser uma atividade diária e passa a ser algo compulsivo, onde a busca pelos resultados compromete o relacionamento com os demais na empresa, esse profissional pode estar sofrendo de um distúrbio de comportamento.
Segundo o clínico-geral especializado em medicina comportamental, Dr. Marcelo Dratcu, ter prazer e gostar de sua atividade, ser pró-ativo e cumprir metas e prazos é fundamental, porém trabalhar excessivamente nem sempre garante bons resultados. "Ainda que trabalhar muito possa ser considerado por superiores ou pelo próprio profissional como pré-requisito para uma boa performance, em algumas situações isto pode ser um tiro pela culatra.", explica Dractu. "O workaholic nem sempre tem um desempenho tão bom quanto gostaria de ter. Ele é muito competitivo, agressivo e intolerante com os colegas criando um péssimo ambiente de trabalho, principalmente quando os outros não seguem o mesmo ritmo", diz o médico. O resultado disso, em geral, é o isolamento e a queda na qualidade de vida e produtividade.
O analista A. R., também na área de investimentos (que concentra uma grande quantidade de trabalhadores compulsivos), explica um dos motivos do extenso horário "A tensão é total durante o mercado, ou seja, enquanto existem negociações na bolsa. Pra quem pensa que quando o mercado fecha, o trabalho termina, está enganado. Existe muito trabalho no que se refere a análise de ações e busca de oportunidades de investimento. O segundo trabalho é bem mais analítico. Sou viciado no "game" e gosto de tomar riscos e fazer apostas, mas sempre com fundamentos e idéias por trás, nunca no escuro." Não há limites para os compulsivos pelo trabalho. Eles têm comportamentos extremos, como trabalhar a qualquer hora (inclusive em feriados e fins de semana), ou em qualquer lugar, até mesmo enquanto comem. Dormem pouco, têm dificuldade para descansar, relaxar ou tirar férias, além de ter uma visão distorcida do que é o lazer. Estes profissionais muitas vezes alcançam sucesso na carreira enquanto ainda são jovens, mas, aos poucos, os sinais e sintomas do stress vão minando a saúde, contribuindo para o aparecimento ou agravamento de problemas, principalmente os cardiovasculares, como pressão alta, infarto e derrame. "Isto é muito freqüente naquelas pessoas que se expressavam com raiva e impaciência, tipicamente classificadas como personalidade do tipo A.", afirma o Dr. Dractu.
A executiva Mirian Zacareli, diretora de Recursos Humanos de um grupo norte-americano de empresas de produtos químicos - NCH - onde atua há mais de 30 anos, dá dicas de como aliar a vida atribulada com a carreira, sem perder a simplicidade da vida. Ela defende que carreira e bem-estar são compatíveis. "Somente quando conseguimos honrar os compromissos na empresa, e também com nossa família, é que podemos nos considerar verdadeiramente felizes. Imaginar em alcançar êxito, separadamente, faltando uma dessas partes, seria como ter uma felicidade superficial, ou passageira."
Miriam explica que é preciso, sim, almejar o crescimento profissional, crescer e prosperar, mas na dose certa. "A ambição sadia, aquela que não o deixa ganancioso, funciona como uma grande motivação. Se você perguntar às pessoas quanto elas gostariam de ganhar para se sentirem felizes, provavelmente, todas responderão algo entre 40% a 60% a mais do que suas receitas atuais. Quanto mais elevado é o salário, a competição se torna maior. E esse tipo de comportamento pode levar a um colapso nervoso.", alerta a especialista em gestão de pessoas.
O fato do indivíduo atuar em um meio ambiente onde as relações são superficiais, e o stress alto, contribui para tornar o trabalho incompreensível e abrir dúvidas sobre quanto é o bastante produzir em nome de uma carreira promissora e do reconhecimento. "Em seu livro sobre inteligência social, Daniel Goleman cita um estudo realizado com cem homens e cem mulheres que usaram dispositivos que mediam a pressão arterial sempre que interagiam com outras pessoas. Quando estavam com a família e os amigos, a pressão arterial caía. Eram interações agradáveis e tranqüilizantes. Quando se deparavam com alguém problemático, a pressão se elevava. O ideal seria evitar esse tipo de convivência, mas na prática isso não é tão fácil, principalmente se a relação for entre chefes e subordinados que sentem um misto de hostilidade, medo e insegurança recíprocos. Os insultos, que podem ser comuns quando vindos de gerentes autoritários, servem para reafirmar o poder e, ao mesmo tempo, fazer com que os funcionários se tornem impotentes e vulneráveis. Essas interações explosivas e, ao mesmo tempo, imprevisíveis, exigem esforços maiores e vigilância".
Fazer uma auto-avaliação e se conscientizar de esta situação prejudica a saúde é o primeiro passo. Ainda que seja considerado pró-ativo e produtivo, o profissional precisa entender que não vale a pena correr o risco de adoecer física ou mentalmente. Aceitar a limitação do organismo já é um começo. "Usar de bom senso, aceitando que você não é uma máquina e que precisa de momentos de descanso o tornará ainda mais produtivo no trabalho", define Dractu. Ele explica que ser produtivo não significa, necessariamente, ter que ficar depois do horário no escritório com a cabeça fincada dos papéis.
O executivo deve aprender a cuidar dos relacionamentos pessoais: família, amigos e comunidade, hobbies e cursos, sonhos e preocupação social têm sido valorizados pelas corporações modernas e desenvolvidas. O equilíbrio pessoal influi na tomada de decisões difíceis e principalmente na sua relação com a solidão do poder. Sem contar que quando o profissional é exposto a situações de alto stress, ele precisa de válvulas de escape que o ajudem a enfrentar os desafios de uma carreira competitiva.
Alguns exemplos de como o empresário pode oxigenar as idéias e priorizar o lado humano ? Cuidar da saúde fazendo esportes, por exemplo ? Priorizar sua família nos finais de semana ? Ingressar em cursos humanísticos de história, teatro, filosofia, artes e culinária ? Criar hobbies e dedicar algum tempo para isto ? Ingressar em entidades de assistência social e colocar a mão na massa oxigena as idéias e princípios |
Com isto, ele divide experiências e frustrações, quebra paradigmas e se torna mais e mais uma pessoa do mundo. Ele efetivamente se sente vivo, contribuindo para o mundo. Cada vez mais, os executivos vão depender de carisma, intuição, criatividade e capacidade de encantar outras pessoas. O mundo já não agüenta mais o chato caricato que não consegue desenvolver um tema que não seja seu próprio trabalho.
É preciso ter consciência de que o sucesso profissional é importante, mas que o maior desafio não é simplesmente chegar ao topo, e sim saber administrar a própria vida e que o maior segredo do sucesso é ser realizado na mesma proporção em sua vida pessoal e profissional.
Teste se você é um trabalhador compulsivo
Atualizado em 6 Set 2011.