Milan Kundera iniciou sua vida literária escrevendo poemas, porém, já em seu primeiro romance, "A Brincadeira", inseriu aspectos políticos e fez uma sátira da natureza do totalitarismo do período comunista. Assim, por força de suas críticas aos soviéticos, o autor foi adicionado à lista negra do partido e suas obras foram proibidas imediatamente após a invasão soviética.
Após se mudar para a França, passou a fazer uma inusitada mistura de romance, contos curtos e ensaios, que ditaram o tom de suas obras pós-exílio. Seu trabalho mais popular é o título "A Insustentável Leveza do Ser", que mostra como uma vida é sempre um rascunho de si mesma e impossível de repetir-se.
Compreendido por muitos como um escritor político, seus livros vão muito além e retratam conteúdos filosóficos simplesmente incríveis. E devido a profundidade de todos eles, o Guia da Semana lista 10 que você deveria ler. Confira:
A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER
É um livro em que o desenvolvimento dos enredos erótico-amorosos se conjuga com extrema felicidade à descrição de um tempo histórico politicamente opressivo e à reflexão sobre a existência humana como um enigma que resiste à decifração - o que lhe dá um interesse sempre renovado. Quatro personagens protagonizam essa história - Tereza e Tomas, Sabina e Franz. Por força de suas escolhas ou por interferência do acaso, cada um deles experimenta, à sua maneira, o peso insustentável que baliza a vida, esse permanente exercício de reconhecer a opressão e de tentar amenizá-la.
A IMORTALIDADE
A partir do gesto que uma mulher faz a seu professor de natação quando sai da piscina, a personagem Agnes surge na mente de um autor chamado Kundera. Como a Emma de Flaubert ou a Anna de Tolstoi, a Agnes de Kundera torna-se objeto de fascínio e de uma busca insondável. Ao imaginar o cotidiano dessa personagem, o narrador-autor dá corpo a um romance em sete partes, que intercala as histórias de Agnes, seu marido Paul e sua irmã Laura com uma narrativa retirada da história da literatura - a relação de Goethe e Bettina von Arnim. Com seus personagens reais e inventados, Kundera reflete sobre a vida moderna, a sociedade e a cultura ocidentais, o culto da sentimentalidade, a diferença entre essência individual e imagem pública individual, os conflitos entre realidade e aparência, as variedades de amor e de desejo sexual, a importância da fama e da celebridade, e a típica busca humana pela imortalidade.
O LIVRO DO RISO E DO ESQUECIMENTO
Primeiro romance escrito na França por Milan Kundera, 'O livro do riso e do esquecimento' é uma narrativa entrecortada de erotismo e imagens oníricas. Em sete partes aparentemente autônomas, o autor lança um olhar sobre o cotidiano da República Tcheca após a invasão russa de 1968 - as desilusões da juventude, a desorientação dos intelectuais, a prepotência dos líderes políticos. Kundera articula o destino individual dos personagens e o destino coletivo de um povo, a vida ordinária de pessoas comuns e a vida extraordinária da História.
A FESTA DA INSIGNIFICÂNCIA
Na forma de uma fuga com variações sobre um mesmo tema, Kundera transita com naturalidade entre a Paris de hoje em dia e a União Soviética de ontem, propondo um paralelo entre essas duas épocas. Assim o romance tematiza o pior da civilização e lança luz sobre os problemas mais sérios com muito bom humor e ironia, abraçando a insignificância da existência humana.
A BRINCADEIRA
Um estudante envia um cartão-postal ironizando o dogmatismo comunista. Punido com anos de trabalho braçal, ele tentará se vingar, mas não sem enfrentar uma série de perguntas. No centro dessa narrativa, contudo, não está a História nem a política, mas sim os enigmas da existência humana.
A IDENTIDADE
Chantal, uma bela mulher não muito jovem, descobre na praia um mundo que não lhe agrada - os homens lhe parecem ridículos, infantilizados, voltados só para os filhos. São todos 'papais', desprovidos de qualquer encanto erótico. Acreditando viver em um mundo em que os homens já não se viram para olhar para ela, Chantal vê JeanMarc invadido por um sentimento de compaixão pela mulher amada. Pouco a pouco Milan Kundera levará Chantal e JeanMarc para a fronteira invisível que separa o real e o sonho, construindo um pesadelo em que o mais assustador será perder a identidade do outro.
UM ENCONTRO
A coleção de ensaios de Milan Kundera é, acima de tudo, uma defesa apaixonada da arte. O leitor habituado ao tom aliciante das narrativas do ficcionista não se sentirá em terreno estranho ao conhecer essa amostra de sua produção crítica. Com a mistura de afetos e ideias que caracteriza seus romances, o autor analisa as principais linhas de força de sua 'galeria imaginária' da cultura, lançando luz sobre a obra de artistas que ajudam a entender aspectos essenciais da realidade.
A VALSA DOS ADEUSES
Em um pequeno balneário decadente, oito personagens se ligam de maneiras improváveis. Esterilidade, amor não correspondido, adultério, depressão, aborto - Kundera reúne neste romance elementos que podem perturbar o amor. Pares se encontram e desencontram como se rodopiassem ao som de uma valsa. A música dá partida para o tema inicial do livro - a gravidez indesejada de uma jovem em contrapartida ao desejo de ser mãe que leva as mulheres até a estação de águas. Aos poucos, Milan nos apresenta a outros pares, a outros temas. E, através deles, levanta questões como a ética dos processos de fertilização, a traição entre amigos, os limites da paixão, as armadilhas do ciúme, o despertar do erotismo, a necessidade de tomar as rédeas da própria vida ou morte.
A LENTIDÃO
Integrando diversos personagens em planos múltiplos - o próprio autor e sua mulher, um entomólogo tcheco, os personagens de uma novela libertina do século XVIII, o 'dançarino' -, Kundera propõe uma discussão sobre a considerada dificuldade de apreensão do real ante a velocidade da vida moderna, a memória e o esquecimento, o clima frenético dos dias contemporâneos e uma época em que se podia retardar o movimento em favor da fruição.
A VIDA ESTÁ EM OUTRO LUGAR
O livro narra a história de Jaromil, crescido na Tchecoslováquia ocupada pelos nazistas e criado pela mãe, que já na infância percebe nele a capacidade de criar rimas e busca cuidar para que se torne um grande poeta. O menino pouco conhece do pai, preso pela Gestapo e morto num campo de concentração. Na juventude, entusiasma-se com a revolução e põe sua arte a serviço da sociedade socialista, abandonando os versos rimados para redigir palavras de ordem. Tem a seu lado Rimbaud, Lermontov, a poesia da afirmação e da embriaguez e deseja ser livre, apesar do universo que o gestou não lhe permitir emancipar-se de suas amarras.
Por Nathália Tourais
Atualizado em 13 Out 2015.