Adaptar uma obra literária para os cinemas é sempre um desafio, mas a tarefa fica ainda mais arriscada quando a obra original é um livro infantil, francês, escrito nos anos 40, que praticamente todo o público adulto já leu ou teve algum contato na infância.
É por isso que “O Pequeno Príncipe”, animação de Mark Osborne que estreia em agosto e será exibida no festival Anima Mundi, é tão valiosa: Osborne (“Kung Fu Panda”) não tenta apenas transpor a obra para a tela da forma como a conhecemos, mas cria uma história completamente nova a partir de sua própria experiência com o livro.
“Ganhei meu primeiro exemplar há mais de vinte anos da minha esposa”, conta o diretor. “Na época, éramos namorados e eu estava me mudando para estudar animação, então o livro veio como uma lembrança de que estaríamos juntos, mesmo à distância. Foi essa mensagem que eu quis passar para o filme.” Osborne também revela que se inspirou na filha para a personagem da “menina” (sem nome) e usou as risadas do filho para o Pequeno Príncipe (que podem ser ouvidas mesmo na versão dublada).
O filme conta duas histórias paralelas e utiliza duas linguagens para isso: na história “real”, focada na menina e no aviador, a animação é em CGI; já na imaginação, onde vive o Pequeno Príncipe, é usado stop-motion. A inclusão de novos personagens e a ampliação da trama original ajudam a atualizar as questões do livro de Saint-Exupéry e inserir críticas ao modo de vida contemporâneo.
A protagonista é uma menina que acaba de se mudar e está prestes a entrar numa escola muito rígida. Sua mãe, solteira e trabalhadora, divide as horas e minutos da menina em tarefas cuidadosamente cronometradas, na tentativa de ajudá-la a ser aceita na escola. Apesar das boas intenções, porém, ela não percebe que, com tantas obrigações, está fazendo sua filha se esquecer do que significa ser criança.
Pois é para resgatar a infância que surge o personagem do aviador – um velho rejeitado pela vizinhança por fantasiar demais. Um dia, ele dá à menina algumas páginas soltas de desenhos narrando seu encontro com o Pequeno Príncipe, um garoto que vivia num pequeno planeta, amava uma rosa e tinha como melhor amiga uma raposa.
Osborne trabalha com a sensibilidade de quem entende o universo infantil e não menospreza seus espectadores mirins. O livro original é recontado e explorado como uma grande metáfora sobre perda, valores e visões de mundo, numa fantasia fascinante que ajuda a pequena protagonista a encarar seus desafios.
Mesmo para quem não conhece ou não gosta tanto do livro, será difícil passar por “O Pequeno Príncipe” sem derramar pelo menos uma lágrima. O filme dosa pequenos momentos de humor, doçura e drama, sem nunca pesar demais nem ser leve demais. Para as crianças que terão seu primeiro contato com a obra pelo cinema, não há dúvida de que o longa deixará uma marca, como o livro deixou aos seus pais e avós. E elas também mostrarão aos seus filhos quando for a hora.
Por Juliana Varella
Atualizado em 21 Ago 2015.