Foto: Gabriel Oliveira |
Flávio Tambellini, Walter Lima Jr., Rodrigo Santoro, André Moraes, Ângelo Paes Leme e Jair Oliveira, na coletiva de Os Desafinados. |
"No Festival de Veneza [em 1997], a gente ia andando pela rua e fui me guiando pelo som de uma flauta. Aí eu fui andando e vi que tocava Insensatez. A gente foi chegando a um bar, que tinha um rapaz tocando. Quando ele se virou, vi que era uma moça". A partir deste episódio, o diretor Walter Lima Jr. começou a criar a história que dez anos depois se tornou o filme Os Desafinados, sobre um grupo de Bossa Nova. Nas telas, é Claudia Abreu quem está tocando no Central Park, e que surpreende Rodrigo Santoro, repetindo o gesto do cineasta.
Aos 70 anos, Walter Lima Jr. conheceu bem o movimento da Bossa Nova, tanto que recontou no filme algumas cenas que acompanhou de músicos como Tom Jobim, Carlos Lyra, Sérgio Mendes e o pianista Tenório Jr. Assim, criou a banda formada por dois atores - Rodrigo Santoro e Ângelo Paes Leme - e por dois músicos - André Moraes e Jair Oliveira. "Acho que foi uma decisão muito inteligente de chamar músicos para compor essa banda, porque nós temos uma linguagem muito peculiar, não só verbal, mas principalmente corporal, e quando você vai montar uma banda, começa a conhecer o parceiro pelo jeito como ele toca, como segura o instrumento", diz Jair.
Ângelo revela que "a idéia do Walter era de mesclar atores que tocassem com músicos que atuassem". Para ele não foi difícil, já que aprendeu a tocar desde cedo com o pai. Primeiro com o violão, mais tarde com o piano, enquanto aprendia teoria musical, e aos 20 anos partiu para o saxofone, instrumento que toca no filme. Santoro também tinha certa intimidade na música, mas não como seu personagem. "O piano é um instrumento que eu tinha certa distância, que até era colocada por mim, por eu achar muito complexo, complicado. É um instrumento que você tem a mão direita, a mão esquerda, e ainda um pé para dar um nó", desabafa o ator.
Foto: Gabriel Oliveira |
A primeira vez que Rodrigo foi tocar com Os Desafinados em um ensaio, não foi fácil. "O Jair estava lá com a violinha dele, o André batucando alguma coisa, o Ângelo com o sax e eu cheguei e vi aquele monstro daquele piano. Sentei e fiquei completamente intimidado". Mas não foi apenas ele que teve problemas, o próprio Jairzinho, músico desde pequeno, também se intimidou. "Para mim não foi essa facilidade toda não porque no filme eu faço um baixista e este não é o meu instrumento".
E não foram apenas os quatro que tiveram que aprender um novo talento no filme. Selton Mello também começou a seguir seus primeiros passos como cineasta, função que adotou depois na vida real, em Feliz Natal. Walter selecionou para ele uma cena de um filme que ele próprio pensava em realizar há 30 anos, e acompanhou o ator em todo o processo de filmagem. "Na saída da locação, ele fez um teste mortal comigo, ele perguntou se eu não me incomodava de ele dirigir a cena e de eu não ir para lá no dia". Apesar dos ciúmes do texto, o diretor aceitou o desafio, já que assim ele enxergaria Selton como um verdadeiro cineasta.
Para que os quatro elementos do grupo entrassem no clima da Bossa Nova, no entanto, não foi tão difícil. Todos eles afirmam que tiveram uma boa base do ritmo desde pequenos, aprendendo a ouvir com os pais, que viveram a época. Quem tem mais intimidade, no entanto, é Jair Oliveira, filho de Jair Rodrigues, que começou sua carreira de músico na mesma época em que começava o movimento musical, e chegou a ter um programa de televisão com Elis Regina. "Toda essa geração da Bossa Nova eu cresci ouvindo e incorporando ao meu trabalho como músico", diz o filho.
Foto: Gabriel Oliveira |
Apesar de problemas na distribuição, o filme estréia no melhor momento, as comemorações dos 50 anos do ritmo que apresentou um outro Brasil ao resto do mundo. Walter Lima e o produtor Flávio Tambellini, dizem, no entanto, que o longa foi feito para ser visto aqui, e não pelos estrangeiros. Independente de qualquer coisa, o elenco não vai esquecer da experiência tão cedo, tanto que resolveu continuar com a banda. "A gente gostou muito de tocar juntos, a gente ficou muito amigo. Então é uma maneira de a gente se manter junto", diz Ângelo.
"Mas eles despediram o pianista", reclama Rodrigo Santoro, que pode perder o posto, já que tem compromissos mais sérios fora do país. Jair explica, "não, o pianista está em carreira internacional". Brincadeiras à parte, o grupo está realmente disposto a se juntar para gravar discos e se apresentar em público. Tanto que eles tentam reservar um espaço na agenda para não deixar o projeto ficar no passado. Agora só resta conseguir reunir os quatro para o primeiro show de Os Desafinados fora das telas.
Atualizado em 6 Set 2011.