Depois de anos de críticas e milhares de matérias sobre o assunto "quero ser DJ", parece que as coisas estão começando a aparecer realmente.
Sempre foi dito que garotos que completam 18 anos de idade não querem mais ganhar carros de presente, mas sim um equipamento completo de DJ, e que artistas rejeitados, geralmente por incapacidade técnica, começam a ser DJs se aproveitando da sua fama - e é o público que sofre pela falta de competência.
Em conversa com vários DJs das antigas - entenda "antigas" os profissionais dos anos 2000 para trás -, pessoas com bem mais de dez anos de experiência, donos de clubs e responsáveis por agenciamento de artistas, todos são unânimes em afirmar que a maioria dos DJs da nova geração são mais "mandrakes" do que profissionais.
O termo "mandrake" se aplica àquela pessoa que faz truques para se dar bem. No caso dos DJs, pessoas que levam CDs mixados, sets prontos em uma pasta, papéis com sequências de músicas e BPMs marcados, pessoas tocadoras de músicas que não possuem a técnica da mixagem, tocam o que rola nas rádios e se aproveitam mais da imagem do que do talento.
O mercado está saturado desses tipos e o espaço dos bons DJs, aqueles que têm o feeling e o arrojo de estourar músicas desconhecidas, se perde. Com isso, as casas não duram mais que um ano e já existem casos de estabelecimentos que abrem vazios, pelo motivo de não querer pagar um valor merecido para um bom DJ, mas preferem colocar um cara que gosta de músicas, baixa versões editadas de faixas de rádio em qualidade de MP3 de 128 Kbps e depois fica se perguntando onde ele errou.
Na década de 90, a vida útil das casas noturnas era de três anos. Atualmente, ela caiu para um ano. Isso é um retrato da banalização do trabalho de DJ. O pior é entender que, em uma casa noturna, a principal parte da casa é o DJ e, mesmo assim, ainda se colocam pessoas sem experiência para carregar este cargo tão importante.
Na Europa, a coisa é bem diferente. As boas casas mantêm seus profissionais e prezam por eles, assim como eles têm atenção para as casas. Um respeito mútuo faz a casa levar nome pelo profissional que toca e o profissional leva o nome da casa em que toca para todas as partes do mundo. Um sistema que tem dado certo, mas que não funcionaria no Brasil. Aqui, as coisas acontecem ao contrário: o bom e barato é trocado pelo ruim e caro.
Entre artistas de novelas, BBBs e ex-cantores de bandas dos anos 80 e 90, as casas pagam milhares de reais, mas, na verdade, pagam por uma bala que dá o tiro no próprio pé. Essas pessoas são interessantes até começarem a tocar, mas, depois que vão embora, o coitado do residente precisa ficar juntando os cacos da noite e, na semana seguinte - ou até no dia seguinte - o retrato do fracasso "imagem X talento" é evidente.
Centenas ou milhares de vídeos estão por aí na internet para provar o que digo. Tanto é a quantidade de "mandrakes" que um site foi criado em forma de protesto contra eles. O Porra DJ tem centenas de relatos e posts relacionados a assuntos principalmente relacionados a DJs brasileiros que são mais a embalagem que o conteúdo.
A facilidade em obter as músicas e a inclusão digital são os grandes vilões na opinião da maioria. Três horas na frente de um PC com internet são suficientes para um DJ organizar um set de duas horas para tocar em uma festa qualquer. Mesmo que ele não conheça o público, ele abaixa a cabeça e "toca um som": se ninguém gostar, ele coloca a culpa no público que não é legal para o som dele.
Com todos estes problemas, as casas, agências e contratantes estão retomando as ideias de trazerem os mais antigos que ainda continuam. Essa atitude tem dado certo em vários lugares, e figurinhas carimbadas com estilos previsíveis tem dado espaço a DJs experientes que são inovadores e muito técnicos. Mas, para isso, agora, os melhores querem valorização: muitos contratantes pagam e não se arrependem.
A ideia de contratar DJs "charlatões" e "plantados" na mídia não está mais com tanta força. Pagar milhares de reais por uma imagem está perdendo força para pagarem algumas centenas por um profissional qualificado e tem dado certo. As pessoas também têm acesso às mídias e as exigências estão maiores. O público agora procura bons locais com boa música e bom atendimento. Estabelecimentos que enchem demais às custas de "mandrakes", "moisés" e outras figuras vêm perdendo espaço, e a tendência é a evolução. Como já diz o ditado: "os bons ficam".
Leia as colunas anteriores do DJ Fabio Reder:
15ª Parada LGBT
Os X DJs na Water Republic
A vida das danceterias
Quem é o colunista: DJ há 18 anos, produtor musical há três anos, divulgador de músicas para rádios desde 1997.
O que faz: DJ, produtor de música eletrônica e empresário do ramo de rádio.
Pecado gastronômico: Lasanha e pavê de Sonho de Valsa.
Melhor lugar do Brasil: Meu estúdio de produção musical.
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Atualizado em 6 Set 2011.