Vela, couro, sapato de salto são ingredientes que não faltam no Projeto Luxúria
Apaixonado por couro, Heitor Werneck desenvolveu o seu talento pela modelagem desde pequeno e, se transformou em um dos maiores costureiros (como ele próprio se define) do país. Seu estilo punk pode ser encontrado na Escola de Divinos, sua loja na região dos Jardins, mas também em uma das maiores baladas fetichistas da capital paulista, o Projeto Luxúria, que ocorre no primeiro sábado de cada mês na Vila Madalena, em São Paulo. Velas, chicotes, vinil e pessoas com os corpos praticamente nus colocam as suas fantasias mais secretas pra fora, literalmente.
Guia da Semana: Como surgiu a idéia desse projeto?
Heitor Werneck: Na verdade, eu faço festa fetichista há muito, muito tempo. A marca que eu tenho, Escola de Divinos, todos os desfiles dela sempre foram fetichistas. Toda vez que eu fazia uma festa era fetichista e eu faço festa em São Paulo há muito tempo, só que eu nunca tive tempo para ficar organizando uma todo mês, fazia a cada seis meses com lista fechada, ou ajudava as pessoas quando estava muito ocupado ou era hostess. O Luxúria tem três anos, que foi quando eu comecei a ter um pouco mais de tempo e foi quando eu comecei a ficar de saco cheio de como a noite de São Paulo anda.
Guia da Semana: Mas você acha que falta o fetichismo na noite de São Paulo?
Heitor: Eu sou dos anos 80, e a gente dos anos 80 tem uma estética de se vestir bem. Quem é punk, e eu sempre fui do movimento punk, a gente tem uma estética sadomasoquista. Qualquer pessoa do mundo tem o seu fetiche, só que tem gente que assume e gente que não, mas todo mundo tem fetiche, qualquer pessoa tem preferências sexuais. A minha estética sempre foi SM (sadomasoquista), eu sempre gostei de couro e isso cai no conceito do fetichismo. Minha preferência sexual é uma coisa assim... eu sou brasileiro, eu sou tarado. Eu gosto de fazer sexo. Se eu sou fetichista, se sou SM, se sou gay, bissexual, ativo ou passivo, independe disso, para fazer uma festa, a gente é brasileiro.
Guia da Semana: Qual é o diferencial do Luxúria?
Heitor: O fetichismo é um lugar, é uma festa que você faz e que a primeira coisa que acontece é a paquera, a conversa e o bem vestir. Esse foi o diferencial, eu não queria uma noite que se encontrasse todo mundo de calça jeans e camiseta e nem gente usando droga no meio de uma pista. Estava sentindo falta de cultura, e lá, para você criar um personagem, você tem que ler, você tem que ter uma história. Estava cansado de entrar em noite e ver gente burra, drogada e mal vestida. Aí, comecei a fazer o Luxúria para existir um lugar onde eu me sentisse bem e que fosse dentro da minha estética. Então, no Luxúria você é totalmente proibido de entrar mal vestido.
Foto: Thiago Marzano
Heitor se diverte com vela
Guia da Semana: O que é mal vestido para você?
Heitor: Calça jeans e camiseta. Eu estou na 25 de Março e parece um bando de macaco, todo mundo vestido igual. É uma coisa que perdeu a estética, perdeu o gosto, as pessoas estão robozinhos. Você coloca calça jeans e camisa para ir trabalhar, para ir a missa, para sair, para ir à feira, é uma roupa padrão, a pessoa não se enfeita, a pessoa não se gosta.
Guia da Semana: Você contra é calça jeans e camiseta sempre?
Heitor: Na minha loja eu não vendo jeans de jeito nenhum. Já me chamaram para desenhar jeans, algumas marcas grandes já me pediram para desenhar jeans, e eu não faço de jeito nenhum. Acho horrível.
Guia da Semana: Você nunca usou jeans?
Heitor: Eu tenho um macacão jeans que eu uso quando vou me mudar e quando estou no sítio plantando. Essa é a minha roupa de depressão.
Guia da Semana: Quantas pessoas costumam frequentar o Luxúria?
Heitor: O Luxúria é uma festa de pequena a média, até umas 200 pessoas. O dia em que chegou a quase 300, eu fechei as portas. Eu não quero que tenha muita gente, se não, perde a graça da festa, que é você olhar a roupa da outra pessoa. O objetivo é se paquerar, se conhecer e se divertir e não ficar apertado. Se eu fico em um lugar apertado, eu não vejo a roupa do outro, não sinto o cheiro do outro, eu não consigo conversar, não consigo namorar, não consigo nada. Eu não tenho vontade de alugar um galpão para fazer essa festa, porque o legal é sempre parecer uma coisa pequenininha, para preservar a intimidade.
Guia da Semana: O que não é permitido na festa?
Heitor: Droga, de jeito nenhum, sexo ao vivo, de jeito nenhum. Pode ter tudo, amarração, chicotinho, pode ter beijo na boca, a mulher pode estar pelada, o homem pode estar pelado, mas sexo, penetração, não.
Guia da Semana: E existe esse respeito, as pessoas realmente não fazem sexo na festa?
Heitor: Quem faz vai ao banheiro. Lógico que vai ter uma pessoa ou outra ali que vai fazer um sexo rápido. Mas quero deixar claro que ali não é clube de swing, ali não é lugar para sexo. É um lugar para deixar todo mundo com tesão, mas não é um lugar de putaria. Outra coisa, ninguém encosta em ninguém. Só rola se é consensual. Se a pessoa está pelada e alguém encosta nela e ela reclama, eu chamo o segurança e ponho para fora na hora, nem chamo atenção. Mas isso não acontece.
Foto: Thiago Marzano
Corpo quase nu é a opção dos mais despojados
Guia da Semana: Muitas pessoas associam as festas fetichistas a libertinagem. Isso é verdade?
Heitor: Mas dentro do próprio mundo SM acontece isso. Nossa festa não é bem vista nos outros clubes e pelas outras pessoas. O conceito do Luxúria é diversão e se vestir, não há regras. Existe um monte de regras nos outros lugares onde acabam indo aquelas pessoas que gostam disso. No Luxúria não. São pessoas que estão preocupadas em se divertir e sorrir, dançar, paquerar, conversar, ver filme. Isso você não encontra nos outros lugares. São pessoas que ficam trancadas em um clubinho falando mal umas das outras e nem fazem sexo.
Guia da Semana: Qual é o perfil das pessoas do Luxúria?
Heitor: É uma garotada de 18 até 70 anos, com classe, pelo menos intelectual, privilegiada. Se é A, B, C ou D eu não vejo, mas é uma festa que é cara, porque a pessoa tem que ter dinheiro para se vestir, se produzir. Não existe VIP, não existem grupos, todo mundo paga. Existe o Dress Code, onde cada um paga de acordo, não existe o grupinho de amigo do DJ ou do dono. Em qualquer lugar do mundo você paga para entrar numa boate, que tem custos com água, luz, segurança, bebida. É errado essa história de aqui no Brasil todo mundo ser VIP.
Guia da Semana: Se uma pessoa mais reservada sentir vontade de ir, o que deve fazer?
Heitor: Vai de calça preta e camisa preta. Não é jeans, pode ser tergal, social, alfaiataria, e uma camisa preta. Já a mulher, vai de vestido e sapato de salto preto. É politicamente correto, ela vai estar bem vestida, e vai ficar encantada com a festa.
Guia da Semana: Qual é o tipo de música que rola?
Heitor: Anos 80 e 90, e eletrônico. Não é techno nem rock pesado.
Guia da Semana: Qual foi a coisa mais bizarra que já rolou?
Heitor: Nunca aconteceu. Só uma vez uma pessoa se empolgou e começou a bater no fotógrafo com chicote, achando que ele gostava. Foi a única coisa ruim que aconteceu na festa até hoje.
Guia da Semana: Quando será a próxima festa?
Heitor: Será no dia 6 (de junho) e o tema é Calígula. Mas esse mês vai ser a primeira vez que vai ter três edições, dia 6, dia 13 - para comemorar o novo site - e dia 21 - vai ser a primeira versão gay no Sogo.
Atualizado em 1 Dez 2011.