Guia da Semana

Ilustração: www.yegustrepo.com


O comportamento pós-moderno para fanfarrões de plantão pede um passo a mais na programação noturna, um degrau a mais na escalada desse arranha-céu chamado diversão - ótima sugestão de nome para filme da Sessão da Tarde.

Da sede com a vontade de beber, nasceu o "esquenta".

Muitas tribos preferem chamá-lo de pré-balada, mas o fenômeno se popularizou mesmo como "esquenta", nome curto, simpático e auto-explicativo, assim como "glote".

Configura-se em esquenta toda situação que anteceda o evento principal da noite, onde o objetivo seja aquecer os motores, preparando a todos para a fase dois, onde o cartão de consumação serve apenas para "manter", como gostam de dizer.

Um objetivo secundário é o de reunir as pessoas num só lugar, facilitando a decisão sobre o destino futuro, promovendo o prejuízo sustentado nas operadoras de telefonia: "ligações locais a 0,0001 nos minutos ímpares dos dias pares" - Tá tá, já sabemos.

O esquenta tradicional é aquele que acontece na cozinha da casa de algum amigo; amigo de um amigo; ou ainda, amigo de um amigo da namorada do enteado do primo do amigo do cara que vende pônei de porcelana lá na 7 de setembro (toda cidade tem uma rua 7 de setembro).

É da natureza do esquenta começar tímido, ou melhor, morno e, à medida que os brindes são propostos e temas polêmicos como o da extração da fimose em recém-nascidos vem à tona, a coisa vai esquentando, se é que você me entende.

A casa pode possuir dezessete ambientes, jardim de inverno, átrio e sala da lareira, mas uma coisa é certa: as pessoas vão se concentrar na cozinha. É lá que encontramos a geladeira, as forminhas de gelo e os copos de requeijão, além de restos resfriados do jantar para beliscar e o interfone:

- O senhor Transformista tá subindo.
- Quem?
- Deixa subir ou não?

Uns ficam sentados, outros fumam na janela. Um desavisado encosta na geladeira e derruba, numa tacada só, toda a coleção de ímãs com sonzinhos. Isso pode acabar com o esquenta, assim como a fatídica pergunta:

- E aí, pra onde?

Ninguém sabe como ela vem, mas todos sabem que quando essa perguntinha é feita, o desconforto é geral. O mais comum é ignorar. Tem gente que aproveita para ir ao banheiro. Os que restam, preparam novos drinques, deixando o interlocutor com cara de dois de paus, frente a frente com o já-se-sentindo-em-casa, transformista.

A pergunta voltará a incomodar a sessão mais pra frente, todos sabem. Cabe ao anfitrião do evento garantir abundância de gelo e de misturas para que o tema mantenha-se distante, o maior tempo possível.

Do movimento "esquenta" surge também a extensão idiomática "queimar a largada".

Queima a largada todo e qualquer cidadão que por algum motivo da ordem do exagero, passe dos limites, ingerindo quantidade considerada insalubre de álcool, impossibilitando sua largada nesta corrida emblemática.

- Eu tô legal. Tô bem, cara. Zuro.
- Zura?

O jeito é chamar o safety car para conduzi-lo em segurança até os boxes.

Daí a grande vantagem de ser você o organizador do esquenta. Se queimar a largada já sabe onde esticar a noite: na sua caminha, bem quentinha.




Leia as colunas anteriores de Adriano:

? Como é difícil assistir jogo em bar: Copa América, Pan, Libertadores, Brasileirão séries A, B, C, café com leite e casados contra solteiros.

? Dia dos Namorados na conveniência do posto: Casais e relacionamentos diferentes e o mesmo final feliz. Feliz?

? Tudo acontece no banheiro da balada: O universo paralelo dos banheiros masculinos.

? Não tenho mais roupa para sair: Você pode estar na lista do Samuel, da Glorinha ou do Curi, mas, infelizmente, camurça não combina com fio tinto, muito menos com lã fria.

? A fila anda: Sábios conselhos para se livrar das filas grandes e chatas que se formam nas portas das baladas.

? Só vim pra dançar: Uma das desculpas mais utilizadas pelas mocinhas festeiras.

? Não rola aquele chorinho?: Dicas para arrumar aquela dose a mais na balada.



Quem é o colunista: Adriano Abdalla. Libanês, paulistano e de sobrancelha junta.
O que faz: é redator publicitário e campeão pan-americano sub-17 de corre-cotia.
Pecado gastronômico: o maior pecado gastronômico é cometido por aqueles que comem esfiha com catchup. Francamente.
Melhor lugar do Brasil: Rua 25 de Março em época de Natal.
Fale com ele: [email protected]
Quer um chorinho? Então acesse seu blog.

Atualizado em 6 Set 2011.