Nossa chegada a Jaipur é um "estupro" aos sentidos. A sequência avassaladora de exageros, do lixo às pessoas, de vendedores de coisas que não se quer e não se precisa à espetacular arquitetura, da ordem urbanística à desordem urbana, da poluição à pobreza, tudo fornece as doses mais elevadas de sobrecarga sensorial que mesmo o mais indiferente indivíduo pode suportar.
Havelis, templos incrivelmente esculpidos, fortalezas e fabulosos monumentos de todas as formas em pedras rosa e marrom, músicos tocando instrumentos exóticos, mulheres envoltas em sáris multicoloridos carregando vasos de água nas cabeças e nas mãos, homens com longos bigodes, turbantes de uma cor ou de várias, animais e tudo o que faz das cidades do Rajastão uma festa vibrante para o turista, uma sedução para fotógrafos, um estímulo para escritores.
Iniciávamos ali nossa viagem ao Rajastão, o estado mais emblemático do país e, ainda que esperançosos, jamais poderíamos imaginar a sequência tão fabulosa de monumentos que veríamos e os momentos mais enriquecedores, curiosos e divertidos que viveríamos na Índia, especialmente depois do tanto que já nos encantara em Delhi, Agra, Sikandra e Fatehpur Sikri.
Ainda que preparados e abastecidos, não imaginávamos que ali começavam as verdadeiras experiências, o mergulho mais profundo no pântano indiano onde estão suas mais nobres e ricas tradições culturais, seus tesouros arquitetônicos mais impressionantes, as mais magníficas experiências antropológicas de toda nossa viagem.
O Rajastão surpreende até o viajante mais experiente, aquele que já conhece lugares exóticos e grandiosos na história, nos costumes e no patrimônio arquitetônico de desenho caprichoso. Aquela avassaladora introdução ao Rajastão demonstrava que o estado potencializa e condensa em si todas as características mais comuns atribuídas à Índia: o trânsito mais louco, os cheiros e sons mais intensos, as cores e sabores mais fortes, a pobreza, a riqueza, os monumentos incríveis, a cultura fabulosa, tudo sempre em doses espetaculares.
Vimos mulheres usando orhnis vermelhos e laranjas brilhantes e sáris esvoaçantes. Vimos homens com bigodes enormes e vistosos turbantes de muitas voltas. É o povo rajastani, então, que representa o maior destaque ao exibir o caráter mais orgulhoso, a altivez mais evidente e o jeito mais nobre que presenciamos em toda a viagem.
O Rajastão tem em sua gente o vestir mais colorido, na humildade o caráter mais digno, nas favelas a feiura mais bela, nos animais a melhor saúde, nas crianças a alegria mais natural. E, ainda que pareça contradição, é justamente esse conjunto de estereótipos que torna a Índia tão vibrante, atraente e interessante. O colorido e energético Rajastão é a síntese mais que perfeita de todas as imensas riquezas e pobrezas, de todas as contradições e contrastes desse país fabuloso.
À primeira vista, são as cores que distinguem as cidades turísticas do Rajastão: Jaipur é a "Cidade Rosa", de um vermelho alaranjado esmaecido e onipresente nas fachadas. Jodhpur é a "Cidade Azul", murada e labiríntica, cujo monocromatismo é o mais curioso e elegante entre todas elas. Jaisalmer é a "Cidade Dourada", cujos tons do arenito proporcionam um efeito espetacular. Udaipur é a "Cidade Branca", onde a cor das casas caiadas, emolduradas por palácios e havelis proporciona uma imponência sem similar. Todavia, um tom predomina: é o vermelho, onipresente em todas as suas variações, tanto nas construções quanto nos monumentos, sedas e cerimônias de casamento.
Leia as colunas anteriores de Arnaldo T. Affonso:
Agra
O Mausoléu de Akbar
A Índia surpreende
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Atualizado em 6 Set 2011.