Eu sou do tempo em que ir à capital dos portenhos era se hospedar em hotéis caros e sujos, comer no Palacio das Papas Fritas e passear na Florida e seu entorno. Dou graças que este tempo passou. Hoje, Buenos Aires tem ótimos hotéis com preço muito razoável, regiões antigas e restauradas, e muitos bairros novos e modernos, sem falar na excelente e variada gastronomia.
Escolhemos nos hospedar em Palermo Viejo. Como um taxista bem-humorado nos contou às gargalhadas, uma fantástica jogada de marketing transformou um antigo bairro em duas regiões cobiçadas e valorizadas: Palermo Soho e Palermo Hollywood. Já tinha visitado as cercanias como "turista" de um dia, mas ficar sediado por ali foi muito mais interessante.
Como o nome diz, Palermo Soho busca o cosmopolitismo do bairro novaiorquino e, na minha opinião, é bastante feliz em sua ambiciosa comparação. Tem lojas transadas em antigas casas e fabriquetas, bons restaurantes, bares e um pessoal muito descolado para dar o toque final. O centro de tudo é a Praça Serrano, mas, hoje, o bairro se espalhou e as ruas Gurruchaga, Honduras, Solere e muitas outras têm muitas atrações.
Escolhemos o Hotel Duque, um pouquinho fora do coração do Soho, mas o preço, a decoração e, principalmente, a gentileza dos funcionários, compensam os passos a mais. Os quartos são bonitinhos, disponibilizam bicicletas para alugar e, no subsolo, uma jacuzzi para relaxar.
Entre as ruas Armênia e Costa Rica estão diversas opções gastronômicas. Em uma única esquina, mais de oito restaurantes e bares se oferecem aos passantes. Eu já estive duas vezes no restaurante Cluny, na El Salvador 4618, e o indico com ênfase, pois pode-se comer, no jardim interno, saladas e massas deliciosas por um preço muito convidativo, algo como U$$ 20 por pessoa com vinho.
Palermo Hollywood é um pouco mais trash e o forte são os restaurantes. Por lá, o Osaka, Soler 5.608 foi uma das melhores opções que provei em muito tempo. Um restaurante fusion, isto é, uma modinha atual, e quer dizer mistura de duas culinárias, no caso peruano e japonês. Mas não estranhe: sushi e cebiche têm muito em comum e as entradas regadas a "caipirinhas" de pisco são de babar. Quando já estávamos quase satisfeitos, resolvi pedir um prato principal, e foi uma glória: polvo na parrilla com molho agridoce e arroz com verduras. Só o que posso dizer é que seria o prato escolhido para a última refeição antes de minha execução! Comparando com outros restaurantes, o Osaka é bem mais caro mas, por esta refeição de comer ajoelhado e ainda com uma sobremesa, pagamos U$ 50 por pessoa.
As compras em Buenos Aires são uma perdição. Tudo muito barato e os brasileiros reinam em todas as lojas. Só tome cuidado: o somatório do cartão de crédito pode surpreender depois de algumas horas em Palermo. Meu objetivo de compras era um lustre, por aqui chamado de aranha. Dei uma volta nas lojas indicadas por perto, mas, no meu caso específico, nada encontrei. Acabei no tradicional bairro San Telmo, onde, aos domingos, acontece a famosíssima feira de antiguidades. No entanto, lojas maravilhosas funcionam normalmente, menos às segundas-feiras.
O bairro tem na praça Manoel Dorrego carros antigos que fazem passeios como antigamente, e seus bares guardam um pouco da história da cidade. Mas muito está mudando, e lugares com fachadas tradicionais têm o interior renovado, e estão se tornando mais uma ótima opção.
Puerto Madero é o que causa maior contraste com o resto da cidade. Um local com escritórios, restaurantes e, atualmente, muitos condomínios, tornou-se um local para deixar os portoalegrenses tristes vendo nosso porto tão mal aproveitado! Eu havia me hospedado aqui em outra oportunidade e tinha gostado muito do cosmopolitismo de ruas fechadas para o esporte e a modernidade pulsante da região.
Do outro lado dos armazéns está o famoso Hotel Faena, obra do arquiteto Philip Stark, que mistura elementos de um antigo prédio industrial com móveis de design e decoração muito louca! Eu amei. O hotel oferece um show de tango intimista que é muito mais caro que o de outras casas da cidade, mas que, para conhecer o hotel e quem sabe jantar no El Mercado ou no El Bistro, os dois restaurantes do hotel, seria uma boa dica.
Para finalizar, indico o Museu Malba, do colecionador Eduardo Constantini. Ele tem no seu acervo obras muito significativas da arte, incluindo o nosso Abaporu de Tarsila do Amaral, ícone do Modernismo brasileiro. O Malba funciona em um prédio especialmente construído para a Fundação Eduardo Constantini a partir de um concurso internacional, vencido pelo estúdio cordobês AFT Arquitetos.
O Museu de Belas Artes também vale uma visita. Não é um Masp, mas é de graça e tem um acervo com alguns artistas importantes. Como fica na Recoleta, depois se pode esticar até o tradicional bairro chique da cidade, que, na minha opinião, está muito descaracterizado pelas bancas de camelô espalhadas por seus caminhos.
Leia as colunas anteriores de Mylene Rizzo:
Edimburgo
A Turquia e seus encantos
Parc de La Villette
Quem é a colunista: Mylene Friedrich Rizzo.
O que faz: Fala sobre história no curso "Encontros com Arte" e acompanha grupos de viagens culturais.
Pecado Gastronômico: doce de ovos.
Melhor lugar do mundo: é o próximo para onde vou viajar.
Fale com ela: mrizzo@terra.com.br ou acesse seu blog Viajando com Arte.
Atualizado em 11 Fev 2014.