Se existe um motivo para ir aos cinemas conferir a adaptação do best-seller “A Cabana”, ele tem nome e sobrenome: Octavia Spencer. A atriz, que recentemente concorreu ao Oscar por “Estrelas Além do Tempo”, tem carisma suficiente para segurar uma produção que, salvo pelos primeiros minutos, tem dificuldade para ir além do discurso religioso de autoajuda.
Não que isso seja, em si, uma falha: o filme promete exatamente isso e seu público-alvo estará plenamente satisfeito com a adaptação. A armadilha está para quem não conhece a obra e, desavisado, é levado a acreditar que está assistindo a um suspense ou, pior, a um drama familiar onde as pessoas, de fato, irão lidar com a tragédia que lhes acomete como uma família: conversando, brigando, colidindo, sofrendo e aprendendo juntos. Mas esta é não é uma história sobre uma família que perde uma filha: é a história de um homem que perde sua fé (a família, e mesmo a menina desaparecida, são meros acessórios).
Tudo começa quando Mack (Sam Worthington) é criança e vê o pai agredindo a mãe. Anos depois, ele não consegue mais acreditar na bondade de Deus, mas é casado com uma cristã fervorosa e tem três filhos perfeitos. Então, durante uma viagem de férias, um filho se afoga e, enquanto o pai corre para socorrê-lo, a mais nova desaparece. Isso poderia se desenrolar para um thriller arrepiante, mas os detalhes da abdução da criança não importam para o roteiro (e nem, aparentemente, para a polícia).
O que acontece depois disso é que o pai se isola, a filha mais velha se retrai e a mãe segue cuidando de dois adolescentes sozinha como se nada tivesse acontecido. Cabe a Deus – ou Papa, como é apelidado carinhosamente –, na pele da própria Octavia Spencer cozinhando tortas e curtindo um som nos seus fones de ouvido (quem assistiu a “Matrix” se lembrará do Oráculo), oferecer ao homem incrédulo um final de semana agradável na mesma cabana onde sua filha fora assassinada. Um tanto mórbido, se me perguntarem... Mas por que não?
Ao lado de Spencer, habitam a cabana outras duas criaturas, interpretadas por Avraham Aviv Alush e Sumire Matsubara. Ele é um Jesus jovem e camarada; ela, a própria Criatividade, ou o Vento, ou o Sopro da Vida, e se apresenta como uma mulher oriental facilmente sensibilizada. É interessante que cada um tenha uma etnia e represente uma religião diferente, mas esse conceito não chega a ser desenvolvido. Note que Alice Braga faz uma participação especial (tenebrosa).
“A Cabana” é um filme que funciona especificamente para o público religioso, mas mais como um sermão de domingo do que como bom cinema – esticado excessivamente por um roteiro de mais de duas horas, explicativo demais e pontuado por viradas óbvias demais. Para fãs do livro, vale o passeio, já que pode ser interessante ver as representações dos personagens na tela. Para todos os outros, talvez seja melhor ficar em casa.
Por Juliana Varella
Atualizado em 3 Abr 2017.