Numa quarta feira de sol, acredite, muito, muito sol, partimos no que foi uma verdadeira cruzada para conhecer os Museu Tattoo Brasil e, é claro, correr vir contar tudo para vocês. No coração da capital paulista, num predinho na Rua Vinte e Quatro de Maio (sim, a mesma da Galeria do Rock), conhecemos o Estúdio Polaco Tattoo, um dos mais renomados – e também mais legais - da cidade.
A expectativa era um pico alternas, com um monte de tatuador gente boa bebendo cerveja e riscando a galera. A realidade foi Márcio Ramos, curador do museu, formado em Artes, com mestrado em Pontilismo na USP e terminando um doutorado na Alemanha. Com paciência de mestre, ele explicou, mostrou e levou a gente pelas mãos pelo acervo de Polaco, que foi aberto ao púplico há exatamente dez anos, no 1º Tattoo Fest Brasil.
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Gravuras, objetos que ilustram a arte primitiva de tatuar, fotografias, máquinas manuais usadas em presídios e até a cabeça de um monge tibetano. Esses são apenas alguns objetos que encontramos por lá. Tudo isso idealizado por Polaco, um cara que, tendo na arte da tatuagem a sua ideologia, montou com seu acervo pessoal esse incrível espaço.
Com o objetivo de informar a origem e a evolução da tatuagem, o museu também cumpre o seu papel de mostrar que tatuagem é mais do que uma simples ornamentação e sim uma forma de usar o corpo como suporte de uma verdadeira obra de arte. Uma cultura milenar que atravessou os séculos, rompeu a sua ligação com a marginalidade e hoje é usada para expressar crenças, ideias ou, simplesmente, forma de adereço – por que não?
O ObaOba foi, conferiu, mexeu até no que não podia e, além de te mostrar tudo o que vimos por lá, a gente te conta um pouquinho das coisas mais interessantes que o Márcio falou para a gente. Se liga:
detalhe da decoração do Estúdio Polaco Tattoo
No Brasil, tatuagem como a gente conhece (já que os índios faziam isso há séculos antes de nós), começou com o dinamarquês Lucky, o Mr. Tattoo. Em 1959, ele aportou em Santos e começou a fazer uma série de pinturas super gráficas e pra lá de psicodélicas. Com o tempo, ele começou a colocar esse desenho na pele da galera, especialmente prostitutas, ladrões e um pessoal mais marginalizado, por isso a impressão ruim que tatuagem teve no nosso país por tanto tempo. Graças a ele, o Brasil começou a fazer parte do mapa da tatuagem moderna, saindo até no Globo de 1975 (que aliás elegeu Lucky como único tatuador da América Latina), até seus seguidores espalharem a mania por aí.
ilustrações do Mr. Tattoo
Mas, muito antes de chegar no Brasil, a tatuagem já era feita em muitas partes do mundo há centenas de anos, não com maquininhas elétricas, como a gente conhece, mas à mão. Com dentes de peixes, ossos, bambu e muito mais, furinho a furinho, na pele. Os Maori, por exemplo, eram uma tribo da Nova Zelândia que usavam e abusavam das tattoos. Ser riscado lá era sinônimo de status e expressão, ou seja, quanto mais, melhor. No corpo, as tatuagens contam a história do guerreiro, mas diferentemente das outras tatuagens tribais, na qual cada desenho tem um signifcado, nos Maori, cada desenho tem um significado e cada composição de desenhos gera outro significado. Massa, né?
objetos e ornamentos da tatuagem asiática primitiva
Já no Japão, a coisa era diferente. Os desenhos eram feitos com bambu e a tinta era nanquim, sim, o mesmo que usa-se até hoje no papel. Uma espécie de martelinho batia no bambu e inseria a tinta debaixo da epiderme, fazendo o desenho. Já os Tailandeses usavam pontas de bronze.
apetrechos em bambu japoneses
No pequeno museu-acervo, tinha tanto coisa que a gente ficava até perdido. De cabeças encolhidas - calma, tudo réplicas, afinal os caras, que são super profissionais, fazem tudo dentro da lei e sem nada em decomposição. Cada obra, pintura e coisinha que tem ali é catalogada, descrita e passada para o governo. Na foto, só a terceira foto é de uma cabeça original: um monge tibetano, cujo crânio fica isolado em uma cúpula de vidro, pois acredita-se que quem tocá-lo recebe o carma do cara - que medo!
cabeças em réplicas e uma original: medo!
Além das cabeças bizarras, o museu, que é um dos dois únicos museus de tatuagem do mundo (o outro fica em Frankfurt), tem uma réplica do que seria a primeira máquina de tatuagem, uma espécie de gambiarra feita com a caneta elétrica de Thomas Edison, mas sem a caneta, e com uma agulha.
patente da máquina de tatuar de Thomas Edson
Também lá você pode ver máquinas usadas pelos presos no Carandiru e uma máquinha original usada para fazer tatuagens em presídios na Rússia, que funciona até hoje. Feita com uma gilette, maçaneta de porta, corda de guitarra e seringa, ele deu corda e mostrou pra gente em ação, com uma frase que chocou a alma: a tinta era feita de sola de sapato derretida e o xixi dos próprios presos!
máquinas de tatuar do Carandiru e original russa - ela ainda funciona!
Polaco é um cara bem popular. Pelas paredes, quadros emprestados da família de Lucky aos cuidados dele, fotos autografadas de índios Maori, esculturas feitas com chapas de máquinas de tatuagem, máquinas de chassi original americanas e sua própria coleção de máquinas originais.
detalhes do acervo pessoal de Polaco
Márcio contou pra gente que, apesar das máquinas automáticas serem as mais vendidas no mercado, os tatuadores tem cada vez mais voltado às raízes e feito eles mesmos suas agulhas. A lei brasileira, porém, é bem chata, já que o tatuador é considerado um microempresário, mas não uma profissão de carteira assinada. Por fim a gente conheceu as tintas da marca do Polaco, que tem 30% menos metal do que outras marcas por conta do clima brasileiro (sol+metal=câncer), que são vendidas no mundo todo e conhecemos também o Thiago Montanari, que trampa no estúdio como tatuador e é um dos poucos do mundo que domina a técnica de tatuagem aquarela.
Thiago Montanari e Márcio Ramos, nossos guias espirituais durante essa aventura pelo mundo da tatuagem
Por Julia Bueno e Ricardo Archilha
Atualizado em 20 Mai 2014.