O ringue quadrilátero dá lugar a uma arena de oito lados. Lá dentro, dois homens estão cercados de grades e têm até 15 minutos para fazer o adversário desistir. As armas usadas são as habilidades adquiridas em diversas artes marciais, que vão do jiu-jitsu ao boxe tailandês. Para isso, as pernas e mãos - aplicam luvas que mal cobrem os dedos - são responsáveis por chutes, socos, joelhadas, chaves de braço e mais uma infinidade de golpes para derrubar um oponente. Ao final do terceiro round, o grito do vencedor leva a plateia ao delírio na modalidade que pretende se transformar no maior entretenimento do planeta.
Apoiadas pelo evento esportivo Ultimate Fighting Championship (UFC), as Artes Marciais Mistas (MMA) começam a atrair o público para os tatames das academias. Com treino intenso e desgaste físico que beira à exaustão, as aulas prometem a integração de conhecimento entre as várias modalidades de luta. Veja mais sobre a prática que pretende transformar você em um exímio combatente, seja na 'trocação' em pé ou nas finalizações no chão.
A arte
Introduzido nos EUA pelos irmãos Gracie nos anos 90, o esporte tinha como objetivo confrontar diversas modalidades. Novo rótulo para o antigo vale-tudo, o MMA é uma luta livre que une artes milenares como jiu-jitsu, muay thai, boxe, wrestling, judô e várias outras modalidades. As técnicas que misturam chute, soco e queda no chão têm por objetivo nocautear o adversário ou finalizar o oponente.
"As pessoas sempre pensam que a sua modalidade é a melhor. No vale-tudo, você tira a prova, já que tem que fazer tudo tanto em pé como no chão", afirma o holandês Aron Davos, com um cartel de cinco lutas no MMA, todas com vitórias. Apesar de levar a prática como hobbie, o analista de sistema veio ao Brasil para aperfeiçor o jiu-jitsu e melhorar sua luta livre.
Sem regras definidas e sem tempo limite, no princípio, o esporte era restrito aos praticantes de arte marcial e a violência extrapolava o octogonal. Com a exploração da venda dos canais pagos para TV e a vontade dos organizadores em difundir o esporte, a modalidade ganhou regras para manter a integridade dos competidores. Atualmente, o esporte é dividido em cinco categorias: peso leve (de 66kg a 70kg), peso médio leve (de 70kg a 77kg), peso médio (de 77kg a 84kg), peso meio pesado (de 84kg a 93kg) e peso pesado (de 93kg a 120kg).
Porque praticar
Eduardo Telles, 34, iniciou nos esportes de luta aos 12 anos. Depois de cinco anos no caratê, migrou para o jiu-jitsu - conquistando competições internacionais e visibilidade - e chegou ao MMA em 2006 - hoje lidera a equipe Nine Nine. "Em termos de luta, o vale-tudo combina todas as artes marciais em um treinamento complexo, dinâmico, onde não dá para ficar entediado", revela.
Para o público que não tem interesse competitivo, a aula já é ministrada em muitas academias brasileiras com uma didática voltada aos iniciantes, como é o caso do CT Nogueira. "Eles estão lá para aprender a parte técnica, são desafiados até o limite, mas em condições que possam voltar para casa e trabalhar normalmente no dia seguinte. A diferença do atleta para esse praticante é que o atleta pode voltar com olho roxo pra casa; ele, não", revela o preparador físico da equipe Team Nogueira, Diogo Leandro de Souza, 28 anos.
As aulas são montadas pelo professor com base em um cronograma bimestral, no qual cada dia ele vai escolher um tema. No boxe, ele trabalha a modalidade com um raio de ação mais curto e intenso em relação aos ringues; no jiu-jitsu, pode aperfeiçoar as técnicas de solo; e o wrestling e o judô desenvolvem transições, isto é, prender o adversário na grade e dali desenvolver o combate.
Nos treinos, as luvas de MMA são usadas somente para trabalhos de grade e chão. Na maioria das vezes, a luva de boxe (16 onças) é a utilizada. Junto a isso, são indispensáveis para fazer sparring a vaselina, caneleira, coquilha e protetor bucal. A academia pode disponibilizar o material para quem está começando, mas o ideal é que cada um tenha o seu.
Vida de atleta
Apesar da invasão nos EUA das aulas de MMA, para quem busca um melhor rendimento no octogonal e até um nível profissional, os praticantes brasileiros fazem outra recomendação. "Tem que ter o conhecimento em pelo menos uma modalidade, para tornar a transição do aprendizado para uma outra muito mais fácil. É duro para o professor dar uma aula dessas para quem não teve contato com nenhuma luta", aponta o professor de MMA Francisco Veras, 41.
Para quem não tem tempo a perder, uma alternativa é mesclar outra modalidade "A técnica você só vai pegar nas aulas específicas. No vale-tudo ele vai aprender o básico", assume Eduardo Telles.
Segundo Diogo Souza, um atleta de alto rendimento precisa de três meses, com treinamento em dois períodos por dia, para se preparar para um combate. "Durante esse período ele treina várias capacidades, como força, resistência, manutenção de força e eleva sua frequência cardíaca quase no limite. Lembrando sempre que alto rendimento não é saúde, e sim resultado!", encerra.
Fuja da rotina
O recomendado é que o aluno participe de duas a três aulas por semana. Como é uma modalidade nova, ainda não existem estudos quanto ao gasto calórico que uma pessoa pode ter durante a prática. Mas os adeptos afirmam que a intensa atividade ocasiona perda de 1,5 a 3 quilos por aula, além de trabalhar com músculos do corpo inteiro. Com preços variados, a mensalidade custa em média R$ 140.
O esporte que exige muito contato e tem como praticantes homens acima dos 80 quilos, ainda assusta a maioria das mulheres. Esse, com certeza não é o caso de Ana Maria Índia, 32 anos e uma das principais competidoras de vale-tudo no país. Ele entrou nas artes marciais pelo jiu-jitsu, e a ausência feminina nunca a incomodou. "Sempre estive acostumada a estar no meio dos meninos e aprendi a me coordenar ali, não acho que o fato do cara ser homem vai fazer ele ganhar de mim. Dentro do tatame não existe sexo, existe força e dedicação", dispara.
Com o tempo e as lutas ganhas em boxe, jiu-jitsu e MMA, ela alcançou respeito e hoje em dia é uma das professoras de artes marciais mistas no CT Nogueira. "Sou chata pra caramba, eu exijo o movimento completo e monto o que seria o meu circuito só que em uma intensidade menor, visando ao melhor desempenho dos alunos", assume Índia.
Por Leonardo Filomeno
Atualizado em 10 Mar 2014.