A luta de classes entre os robôs movidos a vapor e aqueles movidos a diesel volta nos turnos de combates táticos em plataformas de SteamWorld Heist 2, desenvolvido e publicado pela talentosa sueca Thunderful Games.
Antes mesmo de muito curtir SteamWorld Build, eu já tinha a impressão que os criadores da série chegaram ao ponto de conseguirem entregar games transitando pelos mais diversos gêneros e remixando-os sempre que necessário.
SteamWorld Heist 2 chega no próximo 8 de agosto para todos os consoles atuais em formato digital – Nintendo Switch, PlayStation 5 e Xbox Series X|S. A edição de Xbox, aliás, também roda no Xbox One e conta com o recurso Play Anywhere, permitindo aos jogadores alternar entre computador Windows e consoles. No PC, o título está na vitrine da Steam. Se for fã, aproveite o desconto promocional de 10% que termina no dia do lançamento.
Ao contrário de seu antecessor, feito originalmente para o Nintendo 3DS, Heist 2 não nasce pensado para portáteis.
Posso pregar a palavra dos bots movidos a vapor e dizer por que o game merece sua atenção?
Waterworld, mas no espaço, com robôs e bom pra caramba
SteamWorld Heist 2 é uma história de sobrevivência e de conflitos entre facções. E o primeiro destaque é dizer que toda essa aventura está esplendidamente legendada em português do Brasil de início ao fim. Logo de cara percebemos o carinho que os tradutores tiveram com material, em especial ao preservar as várias personalidades do elenco, os trejeitos de cada bot (como gaguejos ou mesmo risadas peculiares) e adaptando referências – como um dos cenários, Barris Fumegantes, que aponta para o filme de 1998.
A introdução nos apresenta o Grande Mar, um “tabuleiro” aquoso orbitando a Terra Estilhaçada (preservando a continuidade de eventos de outros títulos SteamWorld). É no vasto espaço sideral que os robôs a vapor dependem de água para funcionar, um recurso que está perigosamente escasso – talvez as semelhanças não sejam mera coincidência. Para piorar, o precioso líquido está estragando aos poucos e contaminando os bots com uma doença que causa a corrosiva ferrugem, uma ameaça letal para todos os bots metálicos.
E quando há uma crise, há sempre um oportunista: a Marinha Real, com seus dieselbots trajados em azul, impõe um forte controle sobre a água limpa, quem a recebe e ainda por cima extorque os comerciantes do Grande Mar, aumentando tensões pelo tabuleirinho perdido no universo.
Além disso, para piorar a situação, a ferrugem fez robôs mais radicais buscarem outras formas de salvação, levando-os à criação do culto dos Chocalhos, cuja premissa é trocar todas as peças por ossos, já que eles não oxidam.
Desta forma, as tensões entre os Chocalhos e a Marinha Real pela disputa de água escalaram para a dominância de território: enquanto os ossobots dominam o nevado norte Arctica, os dieselbots controlam as águas quentes do Caribe.
É no meio deste cenário que você, jogador, assume o papel do Capitão Quincy Leeway, um robô que vive à sombra de sua lendária mãe, a Mata-Kraken. Mas calma, ainda sem uma tripulação, nossa primeira missão será recuperar o submarino confiscado.
Sem credibilidade e com ajuda de recrutas – a adorável Daisy e Wesley, um robô gentil com um desejo de morrer honrosamente em combate – vamos recuperar a embarcação que está prestes a ser desmanchada para o Capitão Q.
O Grande Mar é cheio de segredos, missões e intrigas esperando para serem descobertas. Então, vamos definir curso e nos preparar para o combate!
Jogabilidade
Todos nós vivemos num submarino verde
Quincy sofre quando se compara à sua mãe e os grandes feitos dela. Por não ter um dos braços, o capitão nunca entra e combate, preenchendo o papel intermediário de comandante entre jogador e tripulação, já que lemos seus comentários e é através dele que vemos o desenrolar da história.
Como líder, você está incumbido de navegar o submarino pelos mares do Grande Mar, enfrentar embarcações inimigas pelo caminho e assim chegar aos postos que contêm missões de estratégia. Uma vez que sua embarcação foi depredada, teremos que comprar e encontrar equipamento para melhorá-lo ao longo da jornada de quase 30 horas. Isso inclui metralhadoras, canhões, tanques de ar para submergir e um monte de apetrechos.
A rota é a principal mudança em relação a SteamWorld Heist: não há mais caminho linear e sem riscos, mas um mar com barreiras naturais e artificiais à espera de equipamentos para ser superado. Pela água marítima, encontramos inimigos em lanchas, fragatas, encouraçados e até mesmo outros submarinos.
Dependendo do tipo de inimigo em alto mar, devemos manobrar bem o nosso submarino e alinhá-lo para tirar máximo proveito de armas laterais, do topo ou de torpedos – para derrotar naves submersas, devemos também submergir e atacar de frente! Ou seja, posicionamento é tudo para os navegantes. Por isso, temos que manobrar cuidadosamente e alinhar nossos tiros para danificar os navios inimigos enquanto evitamos minas subaquáticas, mísseis e poderosos navios de guerra. Se seu navio for destruído, você reaparecerá no último bar visitado, embora qualquer galão coletado seja perdido.
E numa dificuldade progressiva, à medida que conhecemos melhor o Grande Mar, desbloqueamos novos equipamentos para o submarino, incluindo metralhadoras, lasers e foguetes para enfrentar ameaças. Aumentos de velocidade e outros upgrades ajudarão a descobrir novas áreas e navegar nas profundezas.
Assim, para explorar o oceano, SteamWorld Heist 2 traz um sistema de seleção de missões reformulado. O misterioso mundo está envolto numa névoa que devemos dissipar para descobrir novos locais, missões e segredos. Sem perder o foco, claro, que a Marinha Real patrulha as águas do Caribe. Muitas vezes, retiradas estratégicas são uma opção viável. E uma grande muralha separa o sul do norte, Caribe de Arctica… Do outro lado, encontramos os Chocalhos ossudos.
Mas o principal momento “hora da verdade” são as batalhas de combate tático distribuídas em turnos, bem ao estilo de Final Fantasy Tactics. Vamos lá!
Tiros, Estratégias e Canos Fumegantes
Assim como no primeiro jogo, o combate em SteamWorld Heist 2 acontece em turnos para destruir robôs inimigos, recolher o tesouro do lugar e tentar sair vivo pela escotilha. E sim, as balas ricocheteiam. Você ajusta a altura das armas para fazer os tiros ricochetearem em paredes, tetos e até em outros robôs para enganar seus inimigos e realizar tiros absurdamente incríveis – a sensação de acertar um disparo mirabolante é incrível, como um jogo de bilhar elaborado.
Contudo, nem tudo é só sobre o poder de fogo… os bots que habitam o Grande Mar vêm em todas as formas e tamanhos. E eles têm também uma de seis profissões, definidas pela arma que equipam.
Para que a ajuda seja eficaz, é nossa responsabilidade atribuir o trabalho certo para a missão ou trocar o posto com o melhor equipamento. A preparação dos personagens é simples e quase sempre divertida, sem deixar quem está no controle perdido no meio de opções complexas.
Além de uma arma – que, repito, define a profissão – os steambots equipam um chapéu e até três itens diferentes, tais quais botas à prova de frio ou coletes à prova de balas. Quem sabe uma luneta para aumentar a chance de dano crítico? Brincar com essa personalização aumenta nossas chances de sucesso e, claro, de diversão.
E para um resumo das seis classes dos companheiros de equipe: temos os snipers, bombistas, especialistas, combatentes, atrozes e laterais. Os snipers tiram proveito da mira a laser que desenha a trajetória do disparo com uma linha, incluindo as rebatidas; já os combatentes preferem o corpo a corpo e recuperam um pouco de saúde quando proporcionam dano físico.
Não bastasse as inúmeras combinações, cada atol conta com uma missão de condições diferentes: algumas exigem sobreviver com apenas dois companheiros durante oito turnos, pois você caiu numa armadilha achando que era um cofre! Entretanto, outras contam com dispositivos de segurança e vão destruir o tesouro em menos de cinco turnos, mas você pode escolher um time de cinco integrantes. Ou ainda ter que se infiltrar na Marinha Real, usando armamento idêntico ao dos dieselbots.
E é muito bacana ver como as profissões afetam a dinâmica da batalha, que muda turno a turno. Como capitão, você deve ajustar habilidades para um desempenho ótimo! E muitas vezes as armas têm características próprias, como tiros explosivos ou snipers que não precisam ser recarregados, poupando um turno.
Aliás, dá pra misturar habilidades de profissões diferentes com ajuda de umas fichinhas, as engrenagens. Funciona mais ou menos assim: à medida que – digamos Daisy, a sniper – Daisy ganha experiência e sobe níveis, ela ganha engrenagens e, ao mesmo tempo, libera habilidades da classe de sniper, como a mira a laser.
Mas, e se, no futuro, você quiser um atributo do lateral – digamos… os passos extras? Bem, basta equipar uma arma que torne Daisy uma lateral, ganhar experiência e, depois, quando mudar pra outra profissão, marcar o atributo liberado com as tais fichinhas. Dá pra ter um lança-granadas com a mira a laser do sniper, ou ganhar saúde depois do disparo tal qual um combatente.
Assim, criamos diferentes builds com um monte de características. Como disse, SteamWorld Heist 2 dura mais que o antecessor, saindo de 10 para cerca de 30 horas. As possibilidades são quase infinitas no meio do caminho.
Para manter a variedade, nem só de trabalhos alternativos no nosso lado o game vive: os adversários também surgem de todos os tipos e classes, com arsenal característico e especializado.
A Marinha Real, por exemplo, tende a ser mais parruda na defesa e usa muitos drones, snipers, torres e guardas como aqueles de tropas de choque. Frequentemente um comandante dá ordens especiais que agem como modificadores – como dando bônus de escudo aos inimigos. Quando isso acontece, é hora de focar esforços para destruir esse comandante e anular a ordem.
Por outro lado, os Chocalhos – aqueles do culto dos ossudos – partem para ataques físicos e costumam vir em bandos que complicam uma incursão aparentemente fácil. Num – piscar – de – olhos.
Repetitivo?
Como é da natureza do gênero, esses jogos táticos tendem a apresentar paulatinamente conceitos ou atributos novos e repetir um ciclo de batalhas, de histórias, tudo para garantir uma série de pequenas melhorias nos nossos números. Em seguida, com tudo coletado e feito o famigerado grind, partimos para o confronto contra a horda imediatamente mais forte, recomeçando o ciclo.
A riqueza no elenco, com diálogos individuais recheados e muito caprichados, ajuda bastante a manter a narrativa como fio condutor e como principal motivação. Digo logo que não me canso de repetir batalhas, em especial quando modificadores diversos entram em cena.
O garimpo de armas melhores, equipamento espalhado nas bases e a coleta de água limpa – que aqui serve como principal moeda – se faz necessário, ou mesmo obrigatório, em níveis de dificuldade mais altos.
Contudo, se quiser curtir a história e somente pinicar a cabeça com estratégia, jamais sem queimar um fusível, comece SteamWorld Heist 2 numa jornada mais básica em vez de mirar no desafio.
Outro facilitador é o sistema de reputação que varia de área para área do jogo. Não disse ainda, mas assim que uma missão acabar, os integrantes estarão exaustos. Assim, é necessário retornar ao bar, onde estão os alojamentos, para descansar e começar tudo outra vez amanhã.
Ao repetir qualquer missão, você recebe pontos verdes de reputação, quase como uma moeda secundária, que expiram ao final daquele dia se não forem trocadas. A principal vantagem dessa “repetição” toda é aproveitar as recompensas melhores do sistema de reputação.
Controles, visuais e sons
Com inúmeros bots na tela, impressiona saber que todos foram desenhados à mão num estilo cartunesco detalhadíssimo. O traço já icônico dos robôs em cores saturadas e vibrantes fazem SteamWorld Heist 2 respeitar sua herança, misturando na ambientação efeitos de luz e partículas capazes de extrapolar a imersão no tiroteio.
Alguns disparos até ganham um efeito de câmera lenta enquanto a rajada atravessa vagarosamente a sala, distorcendo os efeitos sonoros de acordo, animando com beleza um turno ousado que poderia ter sido um verdadeiro tiro pela culatra.
A interface também ajuda, sendo clara a todos os momentos e intuitiva, nenhum tutorial foi deixado para trás. Uma vez que o título exige leitura, temos que agradecer mais uma vez a ótima tradução ao português do Brasil. Aproveitando, os controles são sucintamente responsivos e, ao jogar no computador, me vi num momento raro, alternando entre controle e o combo mouse e teclado. Por ter jogado num 8BitDo SN30 Pro 2, muitas vezes me senti jogando um dos melhores títulos de Super Nintendo de última geração – como se tal coisa fosse possível.
Daí resta a excelente trilha sonora, mais uma vez retocada pela banda Steam Powered Giraffe – acredite, os integrantes estão representados e aparecem em alguns dos bares cantando com interações fabulosas.
Alguém lá na Thunderful teve cuidado especial em determinar quando a música tem ganho de volume para efeito dramático – seja numa cutscene, seja programada num momento tenso da batalha. Aquela coisa que é muito sutil, mas dá pra perceber e faz uma diferença danada em como o jogador vive a intensidade das decisões.
Vale a pena comprar SteamWorld Heist 2?
Quem já é fã da franquia de robozinhos a vapor encontrará um capítulo inédito que honra, assim como o Capitão Quincy Leeway, seu legado. Frases de efeito, conflitos, humor que permeia temas sérios, contemporâneos e reais – passando pela escassez de recursos vitais em direção ao negacionismo e ao autoritarismo.
Apesar de pensar que gostaria ter visto uma navegação melhor pelos oceanos, o ritmo entre missões está aperfeiçoado em relação ao primeiro Heist e quem gosta do estilo não deve sentir muita repetição, pois as combinações quase infinitas em vários cenários mantém a experiência fresca e a atenção ativa.
Se esse é o tipo de game que você curte, mesmo dentro de um gênero específico, então, sim, tá mais que recomendado! Além disso, complecionistas vão passar das 30 horas com certeza, sem falar nos níveis de dificuldade.
Por fim, o núcleo de jogabilidade em SteamWorld Heist 2 é irretocável: meu desejo é que viessem mais e mais as batalhas táticas como estas – uma espécie de RPG com agência do jogador que vai além da escolha do comando: precisamos mirar, brincar de bilhar na tentativa de acertar um disparo mirabolante que ricocheteia e atravessa três, quatro inimigos. Que explode um barril pelo caminho e instaura o caos ou vira uma batalha aparentemente perdida. É divertidíssimo, viciante e curtiria até mapas de combate entre jogadores!
*Review elaborada em um Xbox Series S, com código fornecido pela Thunderful Publishing.
Pizza Fria
Reviews, notícias e tudo sobre o mundo dos gamesPor Carlos Maestre, Pizza Fria
Atualizado em 30 Jul 2024.