Guia da Semana

Obras agrupadas em um espaço gigante como a Bienal sempre chamam atenção. O tema deste ano, que mesclou arte com política, ainda gera questionamentos sobre como a curadoria trabalhou essa ideia. Em entrevista ao Guia da Semana, os mestres curadores explicam a tônica desta edição do evento. Acompanhe a entrevista:


Foto:
Gabriel Oliveira
Do papel ao grafite: Bienal de São Paulo traz obras de todos os estilos, feitas com os mais diversos materiais

Este ano, qual a expectativa de público até o último dia de evento?
A meta inicial anunciada foi de receber um milhão de visitantes.

Quantas pessoas visitaram a última Bienal?
A 28ª Bienal recebeu 161 mil visitantes. A 27ª teve 535 mil visitas e a 26ª, 917,218 mil.

Gostaria que vocês explicassem a escolha do tema deste ano.
A escolha do tema advém de pesquisas em curso dos curadores-chefe da mostra e, também, se alimenta do repertório da arte brasileira e dos temas levantados pelas edições recentes da Bienal. A eleição de um verso sinfônico de Jorge de Lima para nomear esta edição da Bienal - 'Há sempre um copo de mar para um homem navegar' - aponta para o fato de que, mesmo na discussão da 'política da arte', o que está no centro do debate são as linguagens e sua poética.


O que torna uma obra de arte mais cara ou mais barata que a outra?
Depende do que você chama de 'caro' e 'barato'. O valor de mercado de uma obra de arte depende de inúmeras variáveis que vão do custo de execução da peça até a especulação e o prestígio que se acumula em torno de trabalhos e artistas. Já o custo de produção de uma obra varia conforme a disponibilidade de materiais, a quantidade e a distância dos transportes, o tipo de mão de obra empregada...

Quais são os artistas mais caros que estão expondo nesta bienal?
Aqui a pergunta é ainda mais difícil. Como a Bienal não está diretamente ligada com o circuito de vendas de obras, não temos dados sobre os valores de mercado do que é mostrado aqui. Quanto ao custo de produção, a bienal procura atender as necessidades dos novos projetos, dentro de limites orçamentários. Quando a obra extrapola os limites, é preciso que o artista colabore com estratégias de viabilização de sua obra. De forma que a resposta é incompleta de toda forma.


Foto: Gabriel Oliveira
Exposição, com cerca de 600 obras, aproxima público da arte contemporânea

Nestas 29 edições da Bienal, qual a marca que vocês procuram sempre deixar no público e como é possível inovar sempre?
A Bienal de São Paulo tem um grande diferencial em relação às duas maiores exposições internacionais de arte contemporânea do mundo - a Bienal de Veneza e a Documenta de Kassel -: ela acontece em uma das grandes metrópoles do mundo, dentro de um país de enormes dimensões. Assim, independentemente das particularidades de uma ou outra edição, todas as edições da Bienal têm como marca a interlocução com uma grande população que têm na Bienal uma das principais oportunidades de contato com a arte contemporânea.

Não é por acaso que o projeto educacional é um dos principais investimentos da instituição - não apenas nessa edição - pois ele fortalece e dá consistência à mediação do que se considera de grande importância na arte contemporânea e o público em geral. A ideia de inovação não se restringe à instituição ou dos seus curadores, pois ela é uma das variáveis do trabalho dps artistas.

Vale lembrar que nem sempre o mais novo, ou o que parece mais inovador é o mais potente na arte, embora isso tenha se tornado quase um consenso. No caso específico dessa edição, é interessante reparar que temas e iniciativas das últimas edições foram notados e repropostos, que não se começa do zero a cada dois anos - e isso é particularmente notável na proposta dessa edicão de construir seis 'terreiros', espaços de encontro e atuação, que abrem espaço tanto para debates e palestras como para a dança, o teatro, a perfomance e mesmo para o descanso.

Em toda bienal existe algo que acaba gerando algum tipo de polêmica. Este ano, foram os urubus. Vocês acham que esse tipo de provocação faz parte da arte? A arte provocativa e polêmica ajuda a desenvolver outros tipos de pensamentos e formas de entender o mundo?
A formação de polêmicas midiáticas não apenas faz parte da arte como faz parte da vida cotidiana e da política. Toda a história da arte é marcada por provocações e reações, e isso tanto é reflexo da potência da arte em deslocar significados e modos de ver o mundo, como é parte das dinâmicas de produção de conhecimento e de debate público que estruturam a sociedade.

Não é apenas quando é polêmica que a arte ajuda a desenvolver outros tipos de pensamento; as polêmicas surgem na interação dessa potência da arte com a vida cotidiana, com tudo aquilo que existe para além do espaço expositivo e que, evidentemente, transita por dentro dele.


Foto: Gabriel Oliveira
Dividida em seis "terreiros", Bienal abre espaço para a dança, o teatro e o debate

Num ano de eleições onde até Tiririca foi eleito, ganhando espaço na mídia internacional com títulos como "Brasil elege palhaço", como a arte pode ajudar a pessoa a entender seu papel na sociedade?
Um ponto comum nas falas dos curadores-chefe desde a apresentação do projeto curatorial dessa edição é que a arte pode ser fundamental para relembrar que a política não se restringe ao campo da representação democrática, embora passe por ela. Um dos subtemas da 29ª Bienal, chamado 'O outro o mesmo', reúne diversos trabalhos que nos falam sobre como formamos nossa identidade a partir de reconhecimentos e estranhamentos com a alteridade, a partir de desejos e repulsas, muitas vezes mal confessados para nós mesmos.

Outro dos subtemas, 'Eu sou a rua', apresenta proposta de enfrentamento do indivíduo diante dos consensos e da imensidão das grandes massas, ao mesmo tempo que reúne obras que só puderam ser feitas porque vivemos em sociedade, em contínuo enfrentamento e cooperações. São dois exemplos que de certa forma reabrem o campo da política e também as possibilidades de imbricação dos sujeitos nela.

Mais alguma observação interessante aos leitores?
Além de conhecer as mais de 600 obras de 159 artistas, o visitante da Bienal tem a chance de acompanhar a programação dos terreiros espalhados pela exposição. A programação está disponível no site do evento e é uma chance de viver o contato com a arte contemporânea de outras formas, não apenas olhando e usufruindo das obras, mas em contato com seus propositores.


Atualizado em 6 Set 2011.