Depois do almoço: comércio fechado e parques-cama na Europa Foto: www.morguefile.com |
Imagine sair para almoçar ao meio-dia e só voltar ao trabalho às três da tarde. Praticamente (ou literalmente) um sonho, não? Pois em Madrid, essas básicas três horas de descanso fazem parte do contrato de trabalho de toda a população: o tempo para tirar um cochilo depois do almoço, sim, é oficial. Em outras regiões da Espanha e da Itália, tal "obrigação" também existe, assim como, por incrível que pareça, em algumas cidades do Brasil.
No Nordeste, conhecido carinhosamente por sua "leseira", não é difícil encontrar redes de descanso estendidas próximas a alguns locais de trabalho mais praianos. Mesmo no interior de São Paulo ainda é possível almoçar em casa e aproveitar o horário para um cochilo em frente à televisão - quem nunca viu também operários de rua dormindo lá pelo meio-dia na graminha de um canteiro? Cada um usa o horário de almoço como pode, embora ele pareça ser tão curto nos grandes centros urbanos.
"Sou gaúcha, sempre fui acostumada a fechar o comércio, ir para casa, dormir um pouco e depois voltar para o trabalho. Quando cheguei a São Paulo, comecei a trabalhar no meio da Teodoro Sampaio [uma rua bastante agitada da capital] e vi que a tradição não existia mesmo aqui", conta a empresária Salete Eboni, que resolveu trazer a sesta tradicional do Sul para o Sudeste. Como proprietária de um restaurante, ela tinha nas mãos a oportunidade de incentivar pelo menos uma pequena parcela da população a cultivar a sonequinha.
Depois do almoço: descanso no Espaço Soneca do restaurante Foto: Julian Marques / Guia da Semana |
Pensando assim, ela trouxe redes e as pendurou ali mesmo no salão, entre as mesas. Reservados, os paulistanos não se sentiam tão confortáveis para finalizar o almoço e pular para o descanso ao lado. "Resolvi, então, fazer um espaço mais fechado, com estrutura para o cochilo", conta ela, que criou o Espaço Soneca em seu self service Bello Bello. Com futons, iluminação baixa, almofadas e até pantufas, o espaço é uma espécie de tenda no estilo árabe, que ficou conhecida como pioneira na capital.
A idéia, "grande idéia" como diz Salete, foi muito bem recepcionada pelos estressados trabalhadores da região. "Experimentei uma vez e agora vim de novo. Me senti bem melhor no trabalho depois de ter dormido aqui", opina o usuário Paulo Franco, jornalista, antes de virar para o lado e se render ao sono pós-almoço. "Quem já usou não pára mais. Tem gente que vem aqui todo o dia", analisa, orgulhosa, a proprietária, que já teve que lidar com algumas situações embaraçosas. "Uma professora de inglês já dormiu a tarde toda aqui e, quando estávamos fechando a casa e fomos acordá-la, ela não queria ir embora. Dizia que tinha acabado de deitar", conta.
Kit Sesta
? Não esqueça o tapa-olho. Por mais que a iluminação seja baixa e gostosa, vai ser difícil se concentrar até pegar no soninho. ? Se tiver rinite ou for fresco, esqueça (ou leve sua roupa de cama). Por mais limpo que seja o local escolhido para tirar a soneca, só de imaginar quantas pessoas passaram por lá pode dar início a um ataque. O melhor mesmo é levar um lençolzinho básico escondido na bolsa e estender como quem não quer nada sobre os futons. ? Lembre do fone de ouvido. Ele vai te ajudar a relaxar e a esquecer de que o ambiente lá fora está bombando. Trilha sonora: new age, Chopin, mantra de yoga. ? Compre um personal-ventilador. Sabe aqueles ventiladores pequenos, quase de bolso? Então, compre um e o posicione logo ao lado de você enquanto dorme. Pelo menos até o inverno dar as caras. |
Cair no sono ou não?
Leseira? Cansaço? Pecado da preguiça? Vagabundagem? Os motivos da vontade inexplicável de tirar uma soneca logo depois da refeição não são exatamente esses. "Quando a gente se alimenta existe uma queda da temperatura corporal porque a atividade sangüínea fica toda concentrada nos órgãos usados pela digestão. Essa redução é uma das causas da sonolência, que é perfeitamente normal", explica Luciane de Mello Fujita, médica especialista do Instituto do Sono da Universidade Federal de São Paulo.
Segundo ela, dormir de 20 a 40 minutos depois do almoço, além de ser saudável por restituir o funcionamento do organismo, ajuda no rendimento intelectual. "O cérebro trabalha melhor depois do descanso e o rendimento é bem maior", analisa. A chamada siesta para os espanhóis é conhecida como NAP nos Estados Unidos que, não por acaso, nos transmitiram o não-hábito do cochilo depois do almoço. "Seguimos muito a tradição americana e, embora isso esteja mudando com os estudos da Nap, lá se eles puderem, almoçam em pé", comenta Luciane.
Soneca consentida, maior produtividade Foto: Julian Marques / GDS |
Contrário a esse hábito, o médico diz que tirar um cochilo no meio do dia pode atrapalhar o sono noturno. "O sono não é exatamente igual o tempo todo, temos cinco estágios que oscilam entre o superficial e o profundo. Se você dorme mais de uma vez no dia não tem a seqüência necessária para um sono de qualidade", afirma ele. Controvérsias à parte, Pedro finaliza com a máxima de todos os médicos. "Tudo depende de cada pessoa. Se ela está se sentindo bem mesmo depois de um tempo seguindo esse hábito, tudo bem".
Serviço:
Bello Bello
Rua Teodoro Sampaio, 1097, Pinheiros
Fone: (11) 3088-2242
Instituto do Sono - Unifesp
www.sono.org.br
Atualizado em 7 Ago 2012.